O vento de Fabiana se tornou um furacão de piadas injustas

Rui Barboza Neto

Rui Barboza Neto

  • Kerim Okten/EFE

    Yelena Isinbayeva e Fabiana Murer não tiveram o desempenho esperado no salto com vara em Londres

    Yelena Isinbayeva e Fabiana Murer não tiveram o desempenho esperado no salto com vara em Londres

Chegamos ao fim do salto com vara feminino nos Jogos Olímpicos de Londres. Para nós brasileiros, a prova que será eternamente lembrada pelo vento. Quando Fabiana Murer, nossa principal atleta e destaque mundial da prova, disse em um momento delicado (imediatamente após ter sido eliminada) que o motivo que a fez abortar sua última tentativa na altura de 4,55 m foi uma rajada de vento forte, não faltaram críticas e piadas jocosas para a brasileira. Muitos torcedores não pouparam ofensas à nossa atleta, esquecendo que outras competidoras também não saltaram bem. Como se só Fabiana tivesse errado na prova e ficado de fora dos Jogos. Como se todas as outras tivessem se saído bem e feito uma excelente prova.

Claro que, quando ocorre uma falha de uma campeã mundial, as críticas são esperadas. Mas quando as críticas passam para ofensas pessoais e rótulos injustos, a situação passa a ficar preocupante. Ao contrário do outro texto a respeito da prova que escrevi, em que fui imparcial, neste vou defender a Fabiana. Não pela sua falha na prova, a isto qualquer atleta está sujeito e estes erros são passíveis de críticas, mas pelos rótulos injustos que ela levou. E esta defesa também se estenderá por um debate mais sério e com embasamentos que sustentem a crítica.

Na fatídica qualificação do salto com vara feminino, ocorrida no sábado de manhã, das 39 concorrentes, apenas uma conseguiu superar sua melhor marca no ano. Teve atleta que chegou a saltar meio metro a menos do que saltou no ano. De todas as eliminadas, o mínimo que chegaram a saltar a menos de suas marcas foi de 15 cm. Destaque para a russa Feofanova que tem medalha de prata e de bronze em Jogos Olímpicos e se despediu dos Jogos sem ao menos passar uma altura. Ela zerou na competição.

Mas na final veio a grande mostra da dificuldade que esta prova apresentava em Londres. Das 12 que concorriam ao pódio, 7 não chegaram sequer a saltar 4.55 m, altura que as mesmas alcançaram dois dias antes. Das quatro primeiras colocadas, uma só conseguiu igualar sua melhor marca da vida, a cubana Yarisley Silva, vice-campeã da prova. A quarta colocada, a alemã Spiegelburg, saltou 17cm a menos da sua melhor marca da temporada. A campeã olímpica, Jennifer Suhr dos EUA, saltou 13 cm a menos do que tinha em 2012. E a grande surpresa, o mito Yelena Isinbayeva, além de ficar com o bronze, teve que se contentar com 36cm a menos da sua melhor marca da vida.

Respondendo aos que perguntaram "o vento não era pra todas?". Era, e atrapalhou todas, basta analisar seus resultados. Não entrarei nem no mérito das várias tentativas em falso que muitas atletas fizeram, que a campeã Jennifer Suhr esperava até os últimos segundos para iniciar sua tentativa e nem as desistências quando já estavam no alto e simplesmente caiam em pé no colchão sem tentar ao menos transpor o sarrafo.

Mas e a cubana? Por que só ela conseguiu ir bem? Tem explicação? Tem. Yarisley treina no Estádio Pan-Americano, em Havana, que fica a uns 400 metros do litoral norte do estado, no bairro Cojímar. Lá, por ser próximo do mar, o vento é tão forte que às vezes o seu treinador, Alexander Navas, decide parar o treino de técnica. Yarisley está muito habituada a este tipo de situação e para ela o vento não chega a ser um problema.

Concordo que atleta profissional tem que saber lidar com estas dificuldades. Porém, em Londres a situação estava crítica e os números por si só já provam isso. A execução dos saltos das atletas me traz certeza. Uma entrevista (leia aqui) das medalhistas olímpicas deste ano, que relataram dificuldades para saltar por conta do vento, ratifica o que foi exposto aqui.

As críticas pela falha, como já disse, são naturais. Agora, os rótulos de "amarelona e pipoqueira", se valerem para a Fabiana, terão de valer para a maioria das atletas, inclusive para Isinbaeyva.

Pra finalizar e saindo um pouco do tema, queria parabenizar o auxiliar técnico de Alexander Navas, Thiago Brito Severiano, que estuda na Escuela Internacional de Educación Fisica y Deporte, em Cuba. Thiago é brasileiro e termina seu mestrado no país caribenho. Esta conquista da cubana tem um pouco de Brasil.

Fabiana Murer
Fabiana Murer

Rui Barboza Neto

É bacharel em Esporte pela Escola de Ed. Física e Esporte da USP e treinador de atletismo e preparador físico da Associação a Hebraica de São Paulo. É comentarista do UOL nas provas de salto com vara e em altura.

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