País não tem o que comemorar e é hora de analisar o que aconteceu em Londres

Rui Barboza Neto

Rui Barboza Neto

  • Lalo de Almeida/ Folhapress

    Fabiana Murer errou três vezes em 4,55 m e não chegou à final do salto com vara

    Fabiana Murer errou três vezes em 4,55 m e não chegou à final do salto com vara

Ao final dos saltos verticais, nosso país não tem o que comemorar. Nenhuma final alcançada por nossos três representantes, um em cada prova – Fabiana Murer e Fábio Gomes no salto com vara e Guilherme Cobbo no salto em altura – nos deixou sem torcida no momento de decisão do pódio. Também não tivemos nenhuma melhora de marca pessoal.

O momento é triste, não tem como negar. Esperava-se mais, principalmente no salto com vara, pois vivemos a melhor fase da história brasileira dessa prova. Uma medalha olímpica coroaria esse belo trabalho que Elson Miranda, principal treinador da prova, com a ajuda de Vitaly Petrov, estão fazendo já há alguns anos. Mas a cereja do bolo não veio. E não é porque o bolo está sem essa cereja que ele ficou ruim ou estragou. Não podemos cometer o erro de julgar apenas o resultado de Londres para criticar um trabalho de anos.

 
O melhor que temos a fazer neste momento é analisar de uma forma fria e detalhada o que aconteceu, para podermos, então, achar as respostas do por que não conseguimos sequer alcançar resultados perto do esperado. Essa análise é tão complexa que não cabe num simples texto que escrevo agora. Porém, podem-se levantar alguns pontos.
 
O primeiro é por que nossos atletas não conseguiram repetir, no mínimo, o melhor resultado do ano? A periodização / planejamento para os Jogos foi errada. Em minha opinião, essa resposta não cabe. Ambos os treinadores em questão, Kiyoshi Takahashi (salto em altura) e Elson Miranda (salto com vara), já demonstraram em vezes anteriores que seus trabalhos são bem conduzidos. 
As condições da prova estavam difíceis para se alcançar boas marcas. Sim, mas isso explica apenas as marcas baixas do dia, não chega a explicar a não classificação entre os seus concorrentes, onde sempre figuram. Esporte é dia e não foi o dia deles. Concordo, mas seria pra um ou outro. Porém, os três terem esse problema merece uma análise melhor. 
 
O psicológico dos brasileiros é fraco e eles tremem em momentos decisivos. Ponto que mais foi falado e o que eu mais rebato. Banalizar a psicologia dessa forma dizendo que um psicólogo resolveria o problema de imediato, é dizer que o trabalho psicológico pode ser feito de uma hora para outra. Primeiro, os atletas deste nível costumam ter um trabalho com psicólogo. Porém, o trabalho psicológico é fruto de um processo que deve começar muito antes do atleta se tornar vitrine. Cada indivíduo tem um tipo de resposta a este trabalho e quanto mais cedo começar mais facilmente terá sucesso. Começando só quando o atleta já é um destaque, o sucesso dependerá muito de como ele reagirá a este trabalho terapêutico. 
 
A segunda pergunta é: o que devemos fazer para melhorar? Outra questão que vai gerar inúmeras respostas, e muitas destas estarão corretas. Isso porque muito tem que ser feito para conseguir melhorar. Uma massificação ou pelo menos um aumento na quantidade de praticantes ajudaria na detecção de talentos. Porém, para provas de saltos verticais, um mínimo de estrutura é necessário, ou seja, para aumentar o número de praticantes é preciso aumentar os locais que tenham este tipo de estrutura. E para termos sucesso, não basta termos praticantes e estrutura, temos que ter na mesma proporção profissionais que saibam conduzir o trabalho. Profissionais capacitados e bem remunerados.
 
Por último e talvez o ponto mais polêmico e pouco citado é que devemos rever urgentemente nossa cultura para o esporte. Isso vem como parte do que citei acima, das ações de melhoria, mas também se refere à forma como torcemos e como nossa torcida vê o esporte. Quando a treinadora do judô, Rosicleia Campos, disse em uma coletiva que o povo brasileiro é ignorante no sentido de ignorar como funciona o esporte, ela não está errada.
 
O problema é que em nosso país, acertar tudo antes e errar em Jogos Olímpicos te qualifica como derrotado. Não vemos isso apenas no salto com vara, muito menos só no atletismo. Outras modalidades sofrem do mesmo mal. Ao contrário de muitos países onde um erro na competição mais importante deste fenômeno social chamado esporte é tratado como parte do jogo ao invés de serem feitas críticas ácidas, aqui só a vitória é valorizada. Esporte é isso, decepções e alegrias. Surpresas negativas e positivas. Muito parecido com nossa vida, não?
 
Portanto, com todas essas variáveis, ao se dar uma resposta de imediato para os erros cometidos corre-se o risco de ser injusto. Podemos perceber que estamos muito aquém do ideal. Muito tem que ser feito e pouco se pode fazer até 2016. Como disse antes, é necessária uma análise minuciosa para identificação dos problemas e suas soluções e tal análise é mais complexa do que este texto tenta colocar – ele se resume em apenas pontuar algumas questões.
 
Cobrar o atleta como ele fosse uma máquina não ajuda em nada. Dar bronca e apontar o erro já tem quem o faça, seus treinadores. Eles são os mais capacitados para isso. Da torcida se espera o apoio e a compreensão quando o sucesso não vem. No futebol, quando o time perde e sua torcida o aplaude, o ato é tratado como exemplo de bons torcedores. Isso vale pra qualquer modalidade. Afinal, o jargão "2016 já é logo aí" vale para atletas, profissionais do esporte, dirigentes e também para a torcida.

Rui Barboza Neto

É bacharel em Esporte pela Escola de Ed. Física e Esporte da USP e treinador de atletismo e preparador físico da Associação a Hebraica de São Paulo. É comentarista do UOL nas provas de salto com vara e em altura.

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