Em 1968, nos Jogos Olímpicos da Cidade do México, o pugilista Servílio de Oliveira fez história: conquistou a primeira medalha do boxe para o país, com o bronze que levou após a derrota para Ricardo Delgado, mexicano que acabou com o ouro. Com as esperanças renovadas por dois brasileiros nas quartas-de-final, o Brasil ficou perto de repetir o feito. Mas não foi desta vez, com as derrotas de Washington Carvalho (até 81 kg) e Paulo Carvalho (até 48 kg).
"Já passou da hora", comenta Servílio, que mantinha otimismo com a dupla, mas segue sem ter companhia como medalhista do boxe. "Foi a melhor chance que o Brasil teve nos últimos tempos, e uma medalha teria sido muito positiva para o boxe. Ganhar é bom para a modalidade, bom para o país, bom para todo mundo".
No pobre boxe brasileiro, os profissionais enfrentam dificuldades para crescerem mesmo após os títulos mundiais de Acelino Freitas, o Popó, e Valdemir Pereira, o Sertão. Assim, a prática amadora virou a principal saída, devido à verba fixa ganha, e Servílio enxerga no judô um exemplo para que a evolução prossiga. "Todo esporte depende de um bom desempenho, basta ver o judô, é a modalidade com mais medalhas (junto à vela). Então, eles têm uma visibilidade muito maior", afirma ele, que encerrou sua carreira precocemente, por um deslocamento de retina.
Mesmo sem medalha, o desempenho com quatro vitórias foi muito superior a Atenas, quando apenas um brasileiro venceu e as medalhas ficaram longe. Para o ex-pugilista, a principal diferença destes Jogos para os anteriores foi a maior disposição de recursos. Isto possibilitou uma preparação inédita para o Brasil. Além de contar com uma comissão técnica de origem cubana, liderada pelo técnico João Carlos Soares, os brasileiros puderam viajar e ganhar bagagem internacional. Este ano, por exemplo, prepararam-se na Romênia, onde disputaram torneio, e foram para Cuba, maior escola do boxe olímpico.
"A razão deste resultado é a verba e o empenho do governo federal, pela Lei Agnelo/Piva, que na minha opinião deu condição do pessoal viver exclusivamente disso, diferentemente do meu tempo", explica o ex-pugilista, hoje empresário no boxe e comentarista, que tem esperanças de melhora para um próximo ciclo olímpico. "O tipo de treinamento evoluiu e as viagens deram um gabarito diferente para eles. A hora em que a verba for gasta só com quem tem direito, vai ser ainda melhor".
Viver exclusivamente do boxe chega a ser novidade. Paulo Carvalho, por exemplo, chegou a ser faxineiro antes de entrar para o São Caetano e poder viver do esporte. O próprio medalhista de bronze trabalhava em horário comercial e treinava. Colhetor de amostras da Pirelli, chegava à empresa às 6h da manhã para treinar no local. "Eu pulava o muro porque a essa hora nem estava aberto. Quando o pessoal chegava, eu já estava correndo", relembra.
No entanto, o apoio aos olímpicos não deve servir como uma segurança para a vida. Ele defende a ida ao profissional, que poderia inclusive ter sido feita mais cedo por Washington Silva. "O cara pode até apostar no ciclo olímpico com esse dinheiro, mas, se ficar acomodado, vai ganhar no máximo R$ 2.500, vai ficar velho e voltar a ser faxineiro, trabalhar em construção. O sucesso depende única e exclusivamente de cada um", analisa ele, que, como empresário, foi responsável por levar Valdemir Pereira, o Sertão, a disputar o título mundial em 2006.
Assistindo e comentando ao vivo - pela
ESPN -, Servílio garante que não teria ciúmes de dividir o espaço com um novo medalhista. "Seria burrice, falta de consciência minha, se apostasse contra eles. Foi o esporte que escolhi para praticar, sabe, tudo o que eu tenho consegui com meu esforço relacionado com o boxe, então teria ficado muito feliz com a medalha". Agora, só em Londres.