Futebol rouba espaço de esportes olímpicos e atletas rejeitam "paixão nacional"
Gustavo Franceschini*
Do UOL, em São Paulo
O futebol é a paixão nacional? Não para boa parte dos atletas que vão representar o país em Londres. Aberta ou reservadamente, esportistas de diversas modalidades torcem o nariz quando são perguntados sobre o esporte que movimenta milhões, domina a mídia e relega às demais modalidades parcos espaços de destaque de quatro em quatro anos.
A teoria dos que não aprovam a fascinação pelo futebol é simples. A exposição que os jogadores têm na imprensa atrai para eles boa parte dos investimentos do mercado, tornando a balança do esporte no Brasil desigual para quem batalha em outras áreas.
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“Eu tenho isso mesmo. Não gosto de futebol. Algumas vezes vejo, mas prefiro não dar muito ibope porque eles já têm. O brasileiro gosta muito de futebol, já dão mídia demais. A gente fica muito bravo porque trabalha duro para caramba para nem ter uns dois minutinhos na mídia, e o futebol tem de segunda a segunda. Pega um pouco de birra sim”, diz o ginasta Arthur Zanetti, que vem de família que aprecia o esporte – seu irmão tentou ser jogador de futebol até cerca de 20 anos de idade.
O ginasta está longe de estar sozinho. O sacrifício diário e anônimo faz alguns atletas questionarem até os jogadores de futebol em si. Para Fernando Reis, do levantamento de peso, o esforço feito por Neymar e companhia é incomparável com o de outras modalidades. “Claro, têm de ter talento, mas como esportistas os jogadores não me convencem”, disse o atleta à revista Alone.
A rejeição não é, obviamente, unânime. Alguns atletas se notabilizam por torcerem de forma fanática por seus clubes. Os corintianos Serginho e Leandrinho, do vôlei e do basquete, respectivamente, e o santista Jorge Zarif, da vela, são alguns dos exemplos. Só que às vezes o contato com o esporte faz o então torcedor mudar de opinião.
“Já joguei futsal antes. Meu pai e meu irmão ainda jogam. Só que depois que comecei a jogar tênis de mesa de forma mais profissional, passei a enxergar as coisas diferentes. Dão muita importância ao futebol. Os outros esportes não têm espaço, tudo é futebol”, reclamou Caroline Kumahara, de apenas 16 anos, em entrevista ao UOL Esporte no início do mês.
A torcida também não passa impune ao sentimento, porque enxerga como uma forma de injustiça a divisão de forças do esporte nacional. Em março, em uma coletiva no Yacht Club Santo Amaro, um dos mais tradicionais de São Paulo, uma sócia pediu a palavra e, diante de vários jornalistas, perguntou a Scheidt porque ele não tem o reconhecimento que um bicampeão olímpico como ele merece.
Sem graça, o velejador agradeceu os elogios e desconversou. Para alguns atletas, o embate direto com o esporte mais popular, além de ingrato, não é produtivo. O exemplo mais claro é o de Cesar Cielo, atleta olímpico com maior visibilidade atualmente. Apesar de nunca ter se encantado por futebol, ele é patrocinado pelo Flamengo e frequentemente divide eventos com estrelas dos gramados.
Na última terça, por exemplo, ele dividiu uma entrevista coletiva no Pacaembu com Mano Menezes, técnico da seleção brasileira. “Eu não entendo muito de futebol, mas acho que temos um grupo capacitado e podemos voltar com a medalha”, disse o nadador quando questionado sobre o conselho que deu ao treinador para a conquista do ouro.
*Colaborou Bruno Freitas