Rio de Janeiro, sede dos Jogos Paraolímpicos de 2016 e pesadelo para pessoas com mobilidade reduzida

AFP

No Rio de Janeiro

  • Marcelo Fonseca/Brazil Photo Press/AE

    Prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (segundo à esq.) mostra a bandeira paralímpica trazida de Londres

    Prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (segundo à esq.) mostra a bandeira paralímpica trazida de Londres

Munida de paciência, Viviane Macedo, pentacampeã brasileira de dança em cadeira de rodas, enfrenta o pesadelo diário de milhões de pessoas com mobilidade reduzida no Rio de Janeiro, que em quatro anos receberão os Jogos Paraolímpicos: locomover-se de um lugar para o outro.

Vários ônibus passam a toda velocidade e a ignoram. Outros não estão adaptados para recebe-la. E quando finalmente um deles é obrigado a parar por um fiscal de trânsito, o mecanismo para a subida da cadeira de rodas dele não funciona.

Os desafios são inumeráveis. Não há calçadas, ou elas estão cheias de poças d’água. Os semáforos não têm som. Não existem rampas, ou elas são tão íngremes que obrigam os que têm mobilidade reduzida a fazer uma força brutal para subi-las. Muitos elevadores do Metrô estão quebrados, e os táxis se negam a carrega-los.

“É quase impossível tomar um ônibus nesta cidade”, afirmou a bailarina de 35 anos, que decidiu se mudar para Copacabana para poder tomar o Metrô, que no rio só tem duas linhas e cobre parte da zona mais turística da cidade.

Além disso, ela não sabe se poderá viver por muito mais tempo na cidade. A Copa do Mundo de 2014, os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos do Rio-2016, e o ‘boom’ petroleiro inflacionaram os preços, e o seu aluguel subiu mais de 100% em um ano.

Viviane, que teve poliomielite quando criança mesmo tendo sido vacinada, não recebe nenhuma ajuda estatal e está em processo contra a Prefeitura, à espera de uma prótese computadorizada que custa 30 mil dólares.

Ela só esquece de tudo quando dança, especialmente samba e ‘zouk’, uma espécie de lambada mais sensual. Mas para chegar até o salão onde ela treina e ensina às crianças com deficiência, ela arrisca a sua vida, avançando com sua cadeira pelas ruas entre carros, ônibus e motos que passam zunindo ao seu lado, porque as calçadas estão cheias de obstáculos.

A dança sobre cadeira de rodas ainda não é um esporte olímpico, mas Viviane espera que nos Jogos Paraolímpicos do Rio, que em setembro de 2016 vai acolher cerca de 4.200 atletas de mais de 150 países, deixem um legado para todos.

  • Sérgio Cabral, Eduardo Paes, Carlos Arthur Nuzman, Andrew Parsons e Natália Mayara participaram da apresentação da bandeira paraolímpica no Rio

Mais da metade da frota de ônibus do Rio é adaptada para carregar as pessoas de mobilidade reduzida (contra 100% dos de Londres, sede dos Jogos de 2012), mas muitas vezes o mecanismo está quebrado, ou o motorista não encontra as chaves para acioná-lo, ou até não sabe utilizá-lo.

“O prefeito prometeu que o sistema de transporte BRT (Bus Rapid Transit), escolhido para Rio-2016, será adaptado para pessoas com deficiência. Mas onde o trabalho já começou, na Barra da Tijuca, foram construídas rampas muito íngremes”, afirmou Teresa Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Direitos dos Deficientes (IBDD), em entrevista à AFP.

“O cego tem que ser um aventureiro no Rio. Um amigo meu estava do outro lado da rua onde fica o Instituto de Cegos, onde está o único semáforo sonoro da cidade, e foi atropelado”, contou.

Viviane chega à Copacabana pelo Metrô, depois de pedir ajuda a um funcionário para descer as escadas, visto que o elevador não funciona.

No famoso calçadão da orla, ela afirma ter problemas nos banheiros públicos. “Não há um só banheiro que tenha acessibilidade para deficientes em toda a costa da praia. Você precisa trazer um penico ou aguentar”.

Quando desembarcou no Rio de Janeiro com a bandeira Paraolímpica vinda de Londres, nesta segunda-feira, o prefeito Eduardo Paes prometeu que a cidade irá mudar. “Vamos transformar essa cidade. Transformá-la em algo acessível e amigável para as pessoas com mobilidade reduzida tem que ser um compromisso dos cariocas. Que a chegada da bandeira nos inspire”, afirmou.

Os atletas brasileiros foram grandes protagonistas dos Jogos Paraolímpicos de Londres, onde conquistaram 43 medalhas e ficaram com o sétimo lugar no quadro de medalhas. Mas o retorno para o Brasil pode ser difícil para muitos, admitiu Amaral.

“O atleta muitas vezes passa por um momento de glória, e volta a uma dura realidade no Brasil: não tem profissão nem emprego, ninguém respeita os seus direitos”, explicou Tereza, lembrando que alguns atletas chegaram a passar fome depois de ganhar o ouro.

Andrew Parsons, presidente do Comitê Paraolímpico Brasileiro, delimitou: “O Brasil tem um longo caminho a percorrer em termos de inclusão social de pessoas com deficiência”, admitiu, ainda em Londres.

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