Scheidt relata cobrança de frentista e parceiro diz ser menos popular que "zagueiro de 2ª divisão"

Bruno Freitas

Do UOL, em São Paulo

  • Luiz Doro/adorofoto

    Os iatistas Prada e Scheidt levam a Londres o favoritismo na Star, classe que dominam nos últimos tempos

    Os iatistas Prada e Scheidt levam a Londres o favoritismo na Star, classe que dominam nos últimos tempos

Talvez nenhum dos atletas brasileiros viaje a Londres para a disputa da Olimpíada com um favoritismo ao ouro tão grande como o da dupla da vela Robert Scheidt e Bruno Prada, que estabeleceram uma hegemonia sem precedentes na classe Star nos últimos meses.

No entanto, a pouco mais de 100 dias dos Jogos, eles experimentam um contraditório anonimato no próprio país, pouco afeito ao esporte dos mares, apesar de seu histórico de fartura de medalhas. A vela é o esporte que mais deu pódios ao Brasil em Jogos Olímpicos: 16. O judô vem logo atrás, com 15.

A situação inspira observações curiosas da parceria Scheid/Prada. Eles remetem até a um caso em que o timoneiro foi interpelado por um frentista após a prata de Sydney-2000. 

No entanto, quem mais vive na pele essa contradição é Prada, proeiro de Scheidt no barco favorito da Star. O paulista vem de uma prata em Pequim, mas circula entre seus compatriotas como um desconhecido qualquer. Como o próprio atleta brinca, tem menos cartaz que um jogador de futebol de pouco destaque.

HEGEMONIA RECORDE NA STAR

A atualização mais recente do ranking mundial selou um domínio inédito na história da vela internacional. Nos últimos 12 meses, todos os resultados registrados por Robert Scheidt e Bruno Prada nas competições válidas da Star são primeiros lugares, em desempenho nunca antes exibido, mesmo em outras classes.

Junta desde abril de 2001, a dupla brasileira soma 51 títulos. Apenas de maio de 2011 para cá foram 11 conquistas, a última delas o Trofeo Princesa Sofia, há dez dias, na Espanha.

Diante de tantos números favoráveis, a dupla reconhece a necessidade de trabalhar a cabeça para evitar qualquer sentimento de acomodação no topo da classe.

"A gente está sempre querendo ganhar, não pode deixar se acomodar. Quando temos uma regata ruim, ficamos mordidos, e isso ajuda a gente a buscar novas vitórias, como essa do Princesa Sofia, que ganhamos na última perna, nos últimos 20 metros, quando estava quase perdido", relata Prada.

Os principais adversários em Londres dos bicampeões mundiais Scheidt e Prada (2007 e 2011) devem ser os atuais vencedores do ouro, os britânicos Ian Percy e Andrew Simpson.

Os rivais britânicos representam uma das poucas duplas que estiveram em Pequim na Star. Na avaliação dos brasileiros, eles não levam vantagem por navegarem em casa. "Conhecemos a raia de Weymouth tanto quanto eles", diz Prada.

Scheidt e Prada terão oportunidade de trabalhar na raia olímpica por 45 dias, em diferentes etapas, antes dos Jogos de Londres. Serão dois períodos de treinos, além de uma etapa da Copa do Mundo. A disputa em Weymouth acontece de 29 de julho a 5 de agosto.

"Na Europa, a cultura da vela é muito maior do que no Brasil. Aqui é o país do futebol, você é menos conhecido que um zagueiro de um time da segunda divisão", declara o proeiro, com descontração.  

"No bairro, na escola dos meus filhos, as pessoas conhecem e torcem por nós. Mas lá fora a gente é muito mais conhecido do que aqui. Lá, em época de competição, as pessoas param para tirar foto, pedem autógrafo, é outro nível de reconhecimento", acrescenta o brasileiro da Star.

O currículo de quatro medalhas, sendo duas de ouro, confedere a Scheidt uma notoriedade mais destacada que a do parceiro, impulsionada também por presença em ações publicitárias de grandes marcas.

No entanto, mesmo vendo ao alcance a façanha de virar de forma indiscutível o maior atleta olímpico do país, o antigo rei da classe Laser também admite lidar cotidianamente com o interesse baixo que cerca a vela nacional.

Scheidt passa a maior parte do ano fora do Brasil, em sua casa na Itália ou viajando em competições internacionais. Em solo brasileiro, relata ter vivido poucos momentos de celebridade.

O bicampeão olímpico destaca como exceção a repercussão de sua prata em Sydney-2000, quando perdeu o ouro em uma regata tensa e cheia de toques no embate com o inglês Ben Ainslie.

“Aquela final de Sydney teve bastante repercussão, naquela regata brigada com o Ben Ainslie. As pessoas vinham comentar comigo. Uma vez parei num posto de gasolina e o frentista me falou: 'Você tinha que ter esganado aquele inglês'. Mas a gente sabe que nunca vamos ter a atenção do futebol", afirma Scheidt.

A preocupação a respeito do estranhamento do público comum de esporte no contato com a vela também faz a direção internacional da modalidade refletir. Uma iniciativa para deixar as disputas na água mais atraentes, principalmente para a transmissão de TV, vai ser testada em Londres [na verdade as regatas acontecerão na cidade de Weymouth, a 190 km da capital inglesa].

"Não é um esporte de arena, é difícil de entender. Mas a federação internacional está buscando alternativas para atrair a atenção do público. Tem a medal race, por exemplo, na última regata da Olimpíada, com apenas 30 minutos de duração e pontos dobrados. É uma aposta para fazer a transmissão mais interessante, fazer o público entender o esporte", diz Scheidt.

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