Nem com ajuda de bilionário, Índia consegue ir bem "em casa" durante a Olimpíada
Rodrigo Bertolotto
Do UOL, em Londres (ING)
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AFP PHOTO/Jewel Samad
Lakshmi Mittal, bilionário indiano, participa do revezamento da tocha olímpica em Londres
A piada é que os indianos teriam ouro garantido se a ioga fosse esporte olímpico. Mas a vida real não é nada fácil. Se o Brasil é um país com um desempenho fraco para a proporção de seu território e sua população, essa estatística é bem pior para a Índia (o país asiático tem 22 medalhas, nove delas de ouro, enquanto os brasileiros colecionam na história 97, sendo 21 douradas).
A ÍNDIA NO TIRO
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Torcedores indianos levam a bandeira do país para acompanhar as competições de tiro em Londres
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A confiança estava depositada em Abhinav Bindra, que havia conquistado o ouro em Pequim-08 (foto)
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O favorito fracassou; o jeito foi vibrar com o bronze de Gagan Narang e a prata de Vijay Kumar (foto)
A ioga é o esporte predileto de Lakshmi Mittal, o indiano que é o homem mais rico da Inglaterra. Mas o magnata da siderurgia prefere investir nas modalidades olímpicas, colocando 8 milhões de libras (R$ 24 milhões) na formação de atletas desde 2004. “Nós ganhamos um ouro em Pequim-2008. Agora a esperança é levar pelo menos dois”, prognosticou Mittal.
Jogando praticamente em casa (7% da população de Londres é de origem indiana), a Índia, porém, não tem mostrado melhoras em 2012: até agora, após uma semana de competição, só tem uma prata e um bronze, com os atiradores Vijay Kumar e Gagan Narang, respectivamente. “Tirei uma pedra dos meus ombros com o bronze. Nunca foi tão feliz”, disse Narang, um dos patrocinados de Mittal.
A grande esperança de ocupar o lugar mais alto no pódio, contudo, acabou frustrada: Abhinav Bindra, herói nacional após virar o dono do único ouro individual da história indiana em Pequim-2008, não se classificou nem para a final de sua prova. O consolo dos torcedores foi ver o bronze de Narang e a prata de Kumar.
Para piorar, a Índia sofreu com as mudanças tecnológicas nas Olimpíadas. Sua seleção masculina dominou o hóquei na grama entre Amsterdã-1928 e Moscou-1980, ganhando oito ouros, uma prata e dois bronzes. Mas a história mudou quando foi introduzido o piso sintético no lugar da grama. A modalidade ficou mais rasteira, e os europeus tomaram a supremacia sobre o jogo aéreo dos asiáticos.
O foco agora está no tiro, atletismo, luta, boxe e tiro com arco. Foi para atletas dessas modalidades que Mittal pagou salários, treinadores estrangeiros e temporadas em países de ponta. “A China conseguiu virar uma potência olímpica, por que a Índia não conseguiria?”, se pergunta o bilionário, famoso por festas faustosas mesmo com a crise mundial perdurando, com direito a elefante coberto com pedras preciosas no casamento de seu filho.
Nascido no Rajastão (Índia) dentro de uma família do ramo do aço, Mittal fez dinheiro com minas na Indonésia antes de se estabelecer em Londres em 1995 e expandir sua empresa, a Arcelor Mittal, para a Europa e o resto do mundo (no Brasil, tem plantas em São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e Espírito Santo).
Mittal aproveita a Olimpíada para associar sua imagem ao esporte, a Londres e aos negócios. Ele apareceu no revezamento da tocha pelas ruas de Londres. Mas a imagem mais visível é a retorcida torre de aço que ergueu ao lado do estádio Olímpico, gastando 23 milhões de libras (R$ 69 milhões).
INTRUSA NA ABERTURA
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De vermelho, voluntária indiana invade e participa do desfile da delegação do país na abertura londrina
Na Arcelor Mittal Orbit, cuja arquitetura tem um gosto duvidoso, ele leva até o topo os mais de 100 executivos de empresas que são seus convidados durante os Jogos, com hotel, ingresso e mais despesa pagas pelo bilionário.
Os indianos formam o grupo étnico mais numeroso do Reino Unido, com uma comunidade de 1,6 milhão de migrantes e descendentes. Sua presença é tão marcante que a até a cerimônia da abertura olímpica fez referência a suas músicas e seus artefatos.
Mas a festa de abertura também teve sua gafe. Uma desconhecida desfilou ao lado da delegação indiana por toda a volta do estádio Olímpico, o que fez o chefe da delegação protestar para o comitê organizador. Depois se descobriu que a garota tinha participado das coreografias da abertura e pegou carona no desfile dos esportistas de seu país.
O leste de Londres, onde está o Parque Olímpico, é um grande reduto da comunidade, e a feira dominical na rua Brick Lane é seu cartão de entrada. A rua cheira a curry tamanha é a concentração por lá de restaurantes do país que foi a joia da coroa da rainha Victoria, que também se anunciava como Imperatriz da Índia no século 19.
A primeira participação indiana em Olimpíadas aconteceu em Paris-1900, com Norman Pritchard como único representante e vencedor de duas medalhas de prata. Nunca mais o desempenho foi produtivo.
Muitos apontam a falta de infra-estrutura, a pobreza no país de 1,2 bilhão de habitantes e a corrupção como as causas da fraca performance da Índia. Um caso exemplifica isso. Suresh Kalmadi está respondendo por desvio de dinheiro na organização em 2010 em Nova Déli dos Jogos da Comunidade Britânica (Commonwealth Games), que foram um fracasso de organização. Ele é o presidente da Associação Olímpica da Índia e está em Londres liderando a delegação. Além do gigantismo, Brasil e Índia tem outro ponto em comum.
TORRE INDIANA EM LONDRES
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Vista do Estádio Olímpico e da Arcelor Mittal Orbit, torre erguida pelo indiano Lakshmi Mittal