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Brasil se aproxima de juízes e pensa como usar o "fator da casa" na Rio-16

REUTERS/Kim Kyung-Hoon
Em Londres-2012, Brasil ganhou ouro no judô com Sarah Menezes. Para a Rio-2016, país estuda árbitros para melhorar desempenho imagem: REUTERS/Kim Kyung-Hoon

Guilherme Costa

Do UOL, no Rio de Janeiro

A história das Olimpíadas mostra que competir em casa é excelente negócio. Foi esse um dos motivos, por exemplo, para os britânicos terem saltado de 47 medalhas em Pequim-2008 (19 ouros, 13 pratas e 15 bronzes) para 65 em Londres-2012 (29 ouros, 17 pratas e 19 bronzes). No COB (Comitê Olímpico do Brasil), essa também é uma das maiores apostas para os Jogos de 2016, que serão realizados no Rio de Janeiro. A entidade estabeleceu como meta amealhar 27 pódios, quase o dobro do recorde do país na competição (15). Para isso, desenvolveu um plano que vai muito além de “esperar apoio das arquibancadas”. O conjunto de estratégias dos mandantes inclui ações políticas e avaliações sobre árbitros.

O plano é baseado em algo que foi desenvolvido justamente pelos britânicos. No ciclo entre 2008 e 2012, eles criaram um projeto batizado de “home advantage” ("vantagem da casa", em livre tradução do inglês) e aglutinaram ações voltadas a potencializar o fato de jogar em casa.

O “home advantage” abarca relações políticas (aproximação entre entidades nacionais e federações internacionais), estudo sobre comportamento de árbitros, trabalho mental para a pressão de jogar em casa, administração de família e de relações humanas.

“Acho que o principal fator do home advantage está relacionado a você inverter o conceito da pressão de competir em casa. A gente sentou com todas as gerências do COB e distribuiu responsabilidades desse plano. As questões de logística, relacionamento com federações internacionais, organização do ano de 2016 e do que a gente chama de pré-Jogos, a questão da preparação dos atletas no relacionamento com imprensa, patrocinadores e familiares, a integração dos treinadores, tudo isso tem sido desenvolvido ao longo do tempo. Temos feito preparação mental e reunido profissionais da área para disponibilizar informações que possibilitem um trabalho maior com os atletas e diminuam a ansiedade. Qualquer tipo de informação que possa neutralizar situações de risco e que impactem na performance”, enumerou Jorge Bichara, gerente-geral de performance esportiva do COB.

O COB tem mantido reuniões periódicas com as confederações nacionais, e cada um dos aspectos do “home advantage” é debatido nesses encontros. Existe uma preocupação, por exemplo, com o comportamento de árbitros em modalidades com algum viés subjetivo, como ginástica, saltos ornamentais e lutas.

“Você também tem questões de entender as modalidades subjetivas e quais são os códigos de arbitragem. É preciso saber as tendências de avaliação dessas arbitragens e as questões relativas a recursos para se organizar melhor no período pré-Jogos”, explicou Bichara.

A CBJ (Confederação Brasileira de Judô) tem feito um mapeamento comportamental sobre os principais árbitros da modalidade. Assim, a ideia é que os atletas recebam orientações específicas para cada luta na Rio-2016.

“Acredito que chegaremos à Olimpíada com isso bem mapeado, o que é novo, e isso talvez facilite para o atleta entender como se comportar em cada luta. O judô tem sua regra, está estabelecido, mas tem sempre um ingrediente de subjetividade dentro da interpretação da regra. Entender como cada árbitro atua pode ajudar os atletas e os técnicos”, afirmou Ney Wilson, gestor-técnico de alto rendimento da CBJ.

O boxe também tem tido preocupação especial com o comportamento dos árbitros. Sobretudo por causa da mudança de regras – a Rio-2016 terá um sistema de pontuação diferente dos Jogos anteriores, e os recursos sobre decisões dos juízes não serão mais permitidos.

“A gente tem acompanhado o desempenho dos árbitros e passado isso para os atletas. A gente coloca isso para que eles entendam os golpes corretos que a arbitragem enxerga, por exemplo. Até locais adequados. Você precisa golpear de um jeito que os cinco vejam”, disse Mauro Silva, presidente da CBBoxe (Confederação Brasileira de Boxe).

O COB tem coordenado encontros políticos entre entidades brasileiras e associações internacionais. A pauta nesses casos é estreitar relações a fim de os donos da casa terem mais trânsito em 2016. Também por isso, dirigentes e árbitros que estarão nas Olimpíadas têm sido convidados para os eventos-teste.

“Estamos fazendo um relacionamento com federações e arbitragens em modalidades com decisões subjetivas. Ginástica, saltos ornamentais e lutas, por exemplo. Estamos nos aproximando, e isso faz parte”, ponderou Freire.

Plano também inclui blindagem e controle de redes sociais

Conhecer os árbitros e estabelecer trânsito político em cada modalidade, contudo, são apenas duas das preocupações contidas no “home advantage”. Também existe, por exemplo, uma precaução sobre como os atletas lidarão com redes sociais durante os Jogos.

“Quando eu jogava, o chefe de missão era um general. Ele determinava as coisas. Hoje não tem mais isso”, disse Marcus Vinicius Freire, medalhista de prata no vôlei masculino em Los Angeles-1984 e atual superintendente executivo de esportes do COB. “Mas nós criamos um grupo de técnicos medalhistas, como [Rubén] Magnano [do basquete], Jesús [Morlán, da canoagem] e Bernardinho [do vôlei], e eles falaram o que fizeram para ganhar medalhas. Se o atleta não quiser seguir, paciência, mas o caminho é esse”, completou.

Outro fator que está no espectro do plano é a relação com parentes. “O Michael Johnson [dono de quatro ouros olímpicos, que tem trabalhado com o atletismo brasileiro] foi questionado sobre a maior dificuldade que ele teve para competir em casa em Atlanta-1996. Ele respondeu ‘tickets’. Foi um período em que surgiram primos e familiares que ele nem imaginava ter”, relatou Freire.

É por isso que algumas modalidades farão um plano de blindagem dos atletas. O judô ficará concentrado em Mangaratiba-RJ durante os Jogos, e os lutadores sairão de lá apenas antes de seus combates. Haverá até um helicóptero disponível para eles percorrerem os 105 quilômetros até o Rio de Janeiro.

A canoagem velocidade também não vai ficar na cidade dos Jogos. Jesús Morlán preferiu manter os atletas em Lagoa Santa-MG, onde o time tem treinado, e sairá de lá apenas para competir.

O último item do plano é um trabalho para acostumar os atletas ao ambiente. É por causa disso que alguns eventos-teste têm sido feitos com grande porte, simulando em grande parte a estrutura que os esportistas encontrarão em 2016.

No boxe, segundo Mauro Silva, o Brasil ainda receberá rivais para períodos de treinos. Cazaquistão e Colômbia estão em contato para vir ao país ainda neste ano, e países como Argentina, Estados Unidos e Grã Bretanha negociam viagens para a próxima temporada.

O único país-sede que não conquistou uma medalha de ouro sequer nos Jogos Olímpicos foi o Canadá, que saiu zerado de Montreal-1976. Em compensação, o melhor desempenho de um mandante foi o dos Estados Unidos, que saiu de Los Angeles-1984 com 83 ouros.

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