! Família ocupa igreja e se nega a deixar bairro afetado por obras da Rio-16 - 10/03/2016 - UOL Olimpíadas

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Família ocupa igreja e se nega a deixar bairro afetado por obras da Rio-16

Júlio César Guimarães e Vinicius Konchinski

Do UOL, no Rio de Janeiro

Maria da Penha Macena e Luiz Cláudio da Silva estão determinados: não deixarão a Vila Autódromo sob nenhuma condição. O bairro fica exatamente ao lado do Parque Olímpico do Rio de Janeiro e, desde 2014, teve 96% de suas casas demolidas para abertura de espaço para obras dos Jogos Olímpicos. A moradia do casal de moradores foi derrubada na terça-feira (8) por agentes da prefeitura. Os dois, então, resolveram alojar-se na igreja da comunidade para não abandonar o que resta da vizinhança em que vivem há mais de 20 anos.

O casal levou móveis e pertences pessoais ao pequeno templo da Vila Autódromo horas depois da demolição da casa que eles mesmo construíram e ampliaram ano após ano. Os dois se mudaram junto com a filha e uma amiga, que há meses mora com o casal. Decidiram viver todos na igreja, ainda que improvisadamente, até que consigam uma nova casa para dentro do bairro. O problema é que Maria da Penha e Luiz Cláudio não têm ideia de quando isso vai acontecer.

“Estou aqui por que não tenho outro lugar para ir”, diz Maria da Penha, 50 anos, durante uma pausa no trabalho de organização da mobília e outros objetos dentro da igreja. “A Vila Autódromo é o meu lugar e daqui não vou sair. Vou ficar aqui na igreja até arrumar uma outra moradia aqui. O prefeito, que derrubou a minha casa, vai ter que me dar uma outra.”

Eduardo Paes afirmou na terça, horas depois de demolir a casa de Maria da Penha e Luiz Cláudio, que o casal terá direito a um novo imóvel dentro da Vila Autódromo. A construção da residência está prevista no plano de reurbanização do bairro divulgado pelo prefeito. O projeto prevê a construção de 32 moradias no bairro. As residências devem abrigar as 25 famílias que ainda vivem na Vila Autódromo. Até o início das remoções, 824 famílias viviam no bairro.

O prefeito afirmou ainda que não há data para o início das obras de reurbanização da comunidade. Ele prometeu, contudo, que tudo estará pronto até o início da Olimpíada, em 5 de agosto.

Luiz Claudio desconfia desse plano. Ele mesmo negociou com a administração municipal uma solução para sua permanência da Vila Autódromo por semanas. Poderia ganhar uma indenização milionária ou um apartamento em um novo conjunto habitacional para deixar o bairro, mas se negou a sair. A casa da família foi demolida e ele não sabe se será ressarcido pelo prejuízo que teve. "Não vi a cor do dinheiro até agora", diz.

O professor, porém, não tem pressa para deixar a igreja do bairro. Ele reclama das condições sob as quais vive hoje a sua família. Mesmo assim, não pretende desistir do “ato de resistência” que o levou a ocupar o templo do bairro. “Uma igreja não é um local para se viver. Não tem quarto, cozinha, nada. Mas é o que temos agora”, explica. “Não vamos sair da Vila Autódromo. Temos o direito de viver aqui.”

Demolição foi em dia de homenagem

Luiz Cláudio conta que sua casa foi demolida de manhã. Agentes da prefeitura cercaram a moradia às 6h e informaram que, baseados numa decisão judicial, colocariam o imóvel espaçoso, com três andares, abaixo. O professor e sua família, então, tiveram algumas horas para retirar móveis e objetos da casa. Duas horas após o acionamento de tratores, a casa já havia virado entulho.

Maria da Penha incomoda-se em ver o que restou de sua casa no chão. Fica mais chateada ainda ao lembrar que a demolição ocorreu justamente no Dia Internacional da Mulher e no dia em que foi homenageada pela Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro). Penha recebeu uma condecoração justamente pela liderança que exerce entre os moradores da Vila Autódromo.

“Fui do inferno ao céu no mesmo dia. Um misto de emoções muito grande”, diz Penha, sem se exaltar. “Minha casa é demolida de manhã e, de tarde, recebo uma grande homenagem de deputados.”

Questionado sobre a demolição no Dia da Mulher, Paes respondeu: "Ninguém aqui tem prazer em demolir casas", comentou. "Infelizmente, como prefeito, há decisões que eu tenho que tomar."
 

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