Basquete

Scola "gentleman" arriscou status na Argentina para parar rixa com Brasil

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Scola gosta do Brasil e quis acabar com falta de educação na torcida imagem: Getty Images

Fabio Aleixo, José Ricardo Leite e Pedro Ivo Almeida

Do UOL, no Rio de Janeiro

“Uma grande bobagem” e “tive medo de ficar com vergonha”. Essas foram apenas algumas das fortes frases citadas pelo argentino Luis Scola para repreender tanto os torcedores de seu país como os brasileiros que ficavam se insultando partidas dos Jogos Olímpicos. Com falas como essa e outras ações, o ala da seleção de basquete mostrou elegância em tentar combater a falta de educação que via nas arquibancadas, mesmo quando os jogos não eram entre os dois rivais. Ele se despediu do Rio na noite de quarta-feira, na derrota da Argentina para os Estados Unidos por 105 a 78.    

Scola é um dos maiores carrascos do basquete brasileiro, pontuando muito nas várias vezes em que sua seleção eliminou a verde e amarela nos últimos anos. Mas para os que não gostam dele, é preciso conhecer o lado "gentleman" que foi visto nos Jogos do Rio.        

Tudo começou logo no primeiro duelo da seleção argentina de basquete, contra a Nigéria. Uma Arena Carioca 1 lotada de torcedores do país vizinho via uma guerra verbal entre eles e os brasileiros que acompanhavam o jogo. Logo após a vitória, Scola, que foi porta-bandeira da Argentina na abertura, arriscou sua idolatria com os argentinos para criticá-los pelo que viu e disse que não se sentida representado pelo que via.

"Posso ser antipopular. Mas me parece uma grande besteira que a torcida venha para cantar contra o Brasil e o pessoal do Brasil grite contra a Argentina, se insultando. São coisas que nada têm a ver com o basquete, e sim com o futebol. Não tenho nada contra o Brasil. Não quero que o Brasil perca, a não ser quando jogue contra nossa equipe. Sempre fui muito bem tratado aqui. É uma besteira. Não me sinto identificado", falou. “É uma besteira. Que apoiem a sua equipe e já está. Quando jogue o Brasil que a torcida torça para o Brasil e a torcida da Argentina torça para a Argentina. O resto me parece tudo fora de lugar".

As ações de Scola não pararam por aí. Com receio de briga nas arquibancadas no duelo entre os dois times, o ala do Toronto Raptors, junto de Marcelinho Huertas, pegou o microfone antes do jogo e pediu que os torcedores se comportassem de maneira civilizada. "Em nome de todas as equipes, queremos um espetáculo esportivo com respeito e civilidade", falou Scola, em meio a um começo de vaias, mas no final muito aplaudido pelo ginásio.

Nada ocorreu na partida de mais grave, e o argentino demonstrava alivio após a vitória argentina. Admitiu que sentiu medo de ficar com vergonha. "Me daria vergonha se tivesse briga e insultos nas arquibancadas. Isso é o tipo de coisa que quando vejo me deixa para baixo. Ainda bem que foi uma grande festa. Fico encantado com as pessoas cantando e torcendo por seu time. Não queria insultos e briga aqui hoje (sábado). Estávamos aos olhos do mundo e não queria uma imagem ruins dos dois povos.”

Na última rodada, o Brasil precisava de uma vitória da Argentina sobre a Espanha para se classificar, mas ela não ocorreu. Com um time visivelmente cansado após a batalha contra a seleção brasileira, os argentinos perderam fôlego e foram superados facilmente, resultado que os colocou na quarta colocação do grupo e jogou como rival os Estados Unidos, time que ninguém queria enfrentar. Foram eliminados.

Um dia antes desse duelo, o jornal argentino Olé, conhecido pelo estilo satírico e polêmico, agradeceu o time argentino por supostamente perder de propósito e ter eliminado o Brasil. Scola se sentiu ofendido e criticou a publicação nas redes. “Não entendem nada mesmo”, declarou em seu perfil nas redes sociais.

Elsa/Getty Images
imagem: Elsa/Getty Images

Scola foi questionado pelo UOL Esporte se acha que foi feliz na missão de ser bandeira de um movimento contra a falta de educação dos torcedores por extrapolar na rivalidade. Disse que não sabe o resultado, mas apenas que espera ter contribuído de alguma forma.

“Não posso dizer o que se passa na mente das pessoas, mas tomara que eu tenha dado alguma ajuda, passei a minha mensagem. Não tinha nenhum sentido fazer o que fizeram em uma semana como essa de grande festa. Somos vizinhos, não há razão pra isso. Se existe algum tipo de rivalidade por conta do futebol, não é vindo aqui a esses jogos com músicas de insultos. Tomara eu tenha inspirado. Mas foi uma mensagem pessoal, não posso falar por todos que estavam lá.”

Scola jamais se envolveu em confusões com atletas brasileiros, brigas em quadra ou discussões ásperas. Sempre foi respeitoso e nunca inflamou a rivalidade, com palavras contidas em seu discurso. Fora de quadra, nutre uma amizade muito especial com Tiago Splitter. Os dois se conheceram há mais de dez anos quando atuavam no Tau Cerámica, da Espanha. Foi o argentino quem abraçou o brasileiro, que chegou ao Velho Continente muito jovem. Como forma de homenagear o amigo, batizou seu filho de Tiago. Hoje o garoto já está com nove anos de idade.

O ala argentino é um dos raros jogadores que têm paciência e atende um por um por na apressada zona mista após as partidas. Responde a todas as perguntas com calma e não deixa ninguém sem resposta. Em uma das indagações após a derrota pros Estados Unidos, Scola foi interrompido pela pergunta de um jornalista enquanto respondia para outro. "Me deixe só complementar a resposta pra ele, por favor, e já lhe respondo essa", disse o jogador.

E ele ficou ali nos últimos instantes para mais indagações. Após cerca de 20 minutos, olhou para todos e disse. "Acho que deu né pessoal? Posso ir já?". Todos disseram sim, e Scola caminhava rumo ao vestiário. Mas se engana quem pensou que terminou assim: no meio do caminho, mais um jornalista interpela o jogador. Irritação e pressa? Não. Scola para, responde e continua com sua habitual educação.

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imagem: UOL

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