Máfia cambista da Rio-2016 operou com ingressos reservados a 8 países
Hanrrikson de Andrade e Vinicius KonchinskiDo UOL, no Rio de Janeiro
A quadrilha internacional montada para a venda ilegal de ingressos da Olimpíada de 2016 operou com entradas reservadas a pelo menos oito comitês olímpicos nacionais. Além de tíquetes nominais à Irlanda e à Eslovênia –conforme já revelou o UOL Esporte--, a chamada máfia do ingresso da Rio-2016 comercializava entradas destinadas a Barbados, Chile, Guatemala, Letônia, Panamá e Paraguai.
Bilhetes da Olimpíada nominais a comitês olímpicos desses países estão entre os 813 tíquetes apreendidos pela Polícia Civil com o irlandês Kevin James Mallon no Rio. Mallon é executivo da THG Sports. Segundo a polícia, a empresa obtinha ingressos de várias fontes e os revendia, sem autorização, por um preço acima do oficial. A venda de ingressos por valores acima do mercado é considerada crime no Brasil.
Mallon está preso desde o dia 5, data da cerimônia da abertura da Rio-2016. O executivo já foi denunciado à Justiça pelo MP (Ministério Público) pelos crimes por facilitação de cambismo e marketing de emboscada por associação criminosa, junto com outros quatro estrangeiros ligados à THG.
A empresa é tida como a principal operadora da máfia do ingresso olímpico, de acordo com a polícia. Na Copa do Mundo de 2014, ela também chegou a ser investigada. Nenhum de seus executivos foi condenado.
Na Olímpiada, A THG voltou a operar. Segundo a polícia, a companhia camuflava pacotes de hospitalidade para eventos olímpicos para vender por até R$ 25 mil ingressos que, no site da Rio-2016, eram oferecidos por R$ 1.400. Com isso, esperava lucrar até R$ 10 milhões durante a Olimpíada.
Comitê Rio-2016 cobra explicações
O Comitê Organizador da Rio-2016 já foi informado sobre a origem dos bilhetes apreendidos com Mallon. Segundo o UOL Esporte apurou, o órgão notificou os comitês olímpicos dos países agora envolvidos na investigação para tentar entender como bilhetes reservados às entidades pararam nas mãos da THG.
Procurados pela reportagem, os comitês olímpicos da Eslovênia e da Letônia informaram que os ingressos reservados à entidade foram vendidos à THG pela empresa Cartan Global. A Cartan foi contratada pelos dois comitês para vender ingressos olímpicos nos dois países do leste europeu. A própria empresa confirma que vendeu ingressos à THG. Disse, porém, que essa venda foi legal.
O regulamento de venda de ingressos olímpicos prevê que bilhetes cedidos pelos organizadores de Olimpíada a comitês olímpicos sejam vendidos por revendedores autorizados. Esses revendedores até podem comercializar essas entradas com outras empresas. Essas companhias, porém, não podem vender os tíquetes mais uma vez.
A polícia diz estar segura que a THG comprava ingressos para revende-los. A empresa é mundialmente conhecida por comercializar pacotes para grandes esportivos.
Além de Eslovênia e Letônia, a Cartan também é responsável pelas vendas de ingressos da Barbados, Chile, Guatemala, Panamá e Paraguai --países que tiveram ingressos apreendidos pela Polícia. A Cartan também trabalha vendendo entradas para outros 29 comitê olímpicos nacionais.
A empresa declarou ao UOL Esporte que cumpre todos os regulamentos de comercialização de entradas olímpicas estabelecidos pelo COI (Comitê Olímpico Internacional).
Esquema irlandês leva à prisão
De todos os países envolvidos na investigação da máfia do ingresso, só a Irlanda trabalha com um revendedor diferente de bilhetes olímpicos: a Pro10. A empresa foi contratada pelo Comitê Olímpico Irlandês para vender entradas da Rio-2016 na Irlanda. A Polícia apurou que ela, na verdade, passava esses ingressos à THG, parceira do Comitê Irlandês durante os Jogos Olímpicos de Londres, em 2012.
A transferência dos bilhetes entre a Pro10 e a THG é irregular. Mesmo assim, de acordo com a polícia, acontecia com a anuência do presidente do Comitê Olímpico Irlandês, Patrick Hickey, que também é presidente do Comitê Olímpico Europeu e membro do comitê executivo do COI (Comitê Olímpico Internacional).
Hickey foi preso na manhã de quarta-feira (17) num hotel do Rio. No local, estão hospedados os principais dirigentes do esporte olímpico mundial, inclusive o presidente do COI, o alemão Thomas Bach.
Após a prisão, Hickey afastou-se de todos os cargos que mantinha em instituições esportivas. Em nota, ele já informou que colabora com as investigações.
O COI também informou que colabora e confia nas investigações da polícia brasileira sobre o cambismo na Olimpíada. O porta-voz do órgão, Mark Adams, declarou nesta semana que o comitê estuda mudar a forma de reserva de ingressos a comitê olímpico nacionais para evitar fraudes.
Mario Andrada, diretor de Comunicação da Rio-2016, disse que os organizadores dos Jogos do Rio auxiliam o trabalho da polícia. Destacou ainda que a forma mais segura de compra de ingressos dos Jogos do Rio é pelo site do comitê organizador ou pela TAM Viagens, revendedor autorizado de bilhetes no Brasil.
Franklin Gomes, advogado da THG e Mallon, nega que a empresa ou o executivo tenham cometido crimes. Segundo ele, a THG não vende ingressos da Rio-2016.