Dez dúvidas sobre os custos da Rio-2016, que ficou R$ 400 milhões mais cara
Guilherme CostaDo UOL, no Rio de Janeiro
Os Jogos Olímpicos de 2016, que serão realizados no Rio de Janeiro, ficaram R$ 400 milhões mais caros. A APO (Autoridade Pública Olímpica) anunciou na última sexta-feira (29) uma nova estimativa de custos do evento, que deverá demandar investimento de pelo menos R$ 39,1 bilhões.
A atualização de custos dos Jogos Olímpicos, contudo, não ofereceu apenas respostas. Longe de ser um relatório definitivo, a estimativa apresentada na sexta-feira gerou pelo menos dez perguntas.
1 - O valor apresentado na sexta-feira é definitivo?
Ainda não. O procedimento padrão da APO é apresentar uma atualização da matriz de responsabilidade a cada seis meses, e a ideia do órgão é divulgar mais duas versões sobre os custos dessa parte. A primeira deve ser feita na época da Rio-2016, e a segunda (e definitiva) ocorrerá meses depois.
“Deve acontecer uma conclusão de todo o processo, até para incorporar gastos eventuais durante a realização dos Jogos”, confirmou Marcelo Pedroso, presidente da APO.
O preço do plano de legado também será corrigido – a última estimativa foi emitida em abril de 2015. O comitê organizador trabalhará até o fim com o orçamento de R$ 7,4 bilhões, mas fará uma prestação de contas depois dos Jogos para dizer se cumpriu essa previsão.
2 - Como se chega ao orçamento total dos Jogos Olímpicos?
O orçamento dos Jogos Olímpicos é dividido em três partes. No caso da edição de 2016, que tem uma estimativa de custo de R$ 39,1 bilhões, esse montante pode ser repartido entre matriz de responsabilidade (R$ 7,07 bilhões), legado (R$ 24,6 bilhões) e comitê organizador (R$ 7,4 bilhões).
O valor atualizado nesta sexta-feira é o da matriz de responsabilidade, que aglutina investimentos necessários para o Rio de Janeiro receber os Jogos Olímpicos – construção e reforma de arenas, por exemplo. O plano de legado, maior porção dos gastos, inclui as intervenções urbanas realizadas por causa do megaevento. A última fatia é o custo de operação do comitê organizador, que teve de fazer um corte de gastos no segundo semestre do ano passado para não incorrer em déficit.
Em 2009, quando apresentou a candidatura, o Rio de Janeiro tinha uma previsão de gastar R$ 28,8 bilhões com os Jogos Olímpicos (valor da época). Com correção, seria como se o evento demandasse investimento de R$ 44,39 bilhões.
3 - Aumento de 4% nos gastos públicos. A conta poderia ser maior?
Ainda é impossível dizer exatamente a quantidade de recursos públicos direcionados aos Jogos Olímpicos. No entanto, a matriz de responsabilidade apresentada na sexta-feira aumentou a participação pública no custeio do evento.
Do total da matriz (R$ 7,07 bilhões), a fatia de dinheiro público aumentou de 36% para 40% entre agosto de 2015 e janeiro de 2016. A explicação é que o investimento da iniciativa privada foi concentrado nos primeiros anos do projeto, até 2011.
“Dificilmente a gente vai conseguir algo do setor privado agora”, admitiu o prefeito Eduardo Paes. “Se a gente tivesse atrasado as coisas, a conta do setor público seria muito maior”, concluiu.
4 - Por que o custo dos Jogos Olímpicos subiu R$ 400 milhões?
“Basicamente, arquibancadas temporárias e [estrutura de] energia temporária”, explicou Eduardo Paes em entrevista coletiva. A matriz de responsabilidade contabiliza apenas projetos que tenham custo, previsão de conclusão e ente responsável. Por isso, itens previstos desde o dossiê de candidatura são colocados paulatinamente nos relatórios.
A matriz apresentada na sexta-feira, por exemplo, tem um acréscimo de R$ 290 milhões somente com contratação de serviços de energia temporária para as regiões de Deodoro e Maracanã. Esse serviço estava previsto desde a candidatura, mas o projeto ainda não havia atingido maturidade suficiente para inclusão no documento.
5 - Dinheiro público também na energia temporária?
A estrutura de energia temporária demandará investimento de R$ 460 milhões, mas apenas R$ 290 milhões foram incluídos na matriz de responsabilidade. Os outros R$ 170 milhões foram alocados no orçamento do Comitê Rio-2016.
No entanto, o Comitê Rio-2016 não vai pagar os R$ 170 milhões. O órgão alinhavou com o governo do Estado do Rio de Janeiro a criação de um mecanismo de renúncia fiscal. A proposta foi apresentada pelo governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) à Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) em novembro de 2015 e ainda não foi sequer analisada pelos deputados.
Se o projeto for aprovado, portanto, os R$ 460 milhões necessários para o custeio da energia temporária na Rio-2016 serão divididos entre governo federal (R$ 290 milhões) e governo estadual (R$ 170 milhões), ainda que a menor porção seja de responsabilidade do comitê Rio-2016. A Tecnogera, empresa responsável pela instalação dos aparatos da área, começou a trabalhar antes mesmo de assinar contrato.
6 - Por que nem todas as arenas estão na matriz de responsabilidade?
A matriz de responsabilidade reúne as obras fundamentais para o Brasil receber os Jogos Olímpicos. No entanto, equipamentos como o Maracanãzinho, o pavilhão 6 do Riocentro, a HSBC Arena e as quadras do vôlei de praia não estão nos R$ 7,07 bilhões divulgados na sexta-feira.
A explicação da APO para isso é que HSBC Arena e Riocentro são estruturas que a cidade não usa apenas para os Jogos. Portanto, as obras nos dois espaços foram alocadas no plano de legado do Rio de Janeiro.
Nos dois casos, segundo a APO, a prefeitura incluiu as reformas em discussões com os concessionários responsáveis pelos espaços. O Comitê Rio-2016 bancará aspectos como customização e espaço de competição.
Também sairão do orçamento do comitê organizador os custos para aprontar o Maracanãzinho e instalar a estrutura móvel do vôlei de praia em Copacabana.
7 - Em que parte do orçamento vão ser colocados os gastos com segurança?
O orçamento dos Jogos Olímpicos de 2016 não contempla, na matriz de responsabilidade, no plano de legado ou nos custos do comitê organizador, o valor a ser investido em segurança para a realização do evento. O montante destinado a essa seara será oriundo de cofres federais.
“Essas funções de governo não podem ser empurradas para o comitê organizador. É um equívoco ter segurança privada em qualquer lugar. A segurança tem de ser pública, e essa é uma tarefa essencialmente do Estado. Nem Londres conseguiu privatizar e teve de colocar o Exército lá”, lembrou Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro, em alusão a uma crise de gestão que precedeu o início dos Jogos Olímpicos de 2012.
“A gente ainda está discutindo com entes públicos a forma correta para realizar essa contabilização, especialmente em segurança interna. Existe uma natureza pública, e em vários aspectos a segurança é um serviço público intransferível. A lógica é que isso pode gerar legados no futuro”, corroborou Marcelo Pedroso, presidente da APO.
8 - Existem outros custos que não foram considerados no orçamento até agora?
Sim, existem. É o caso da remoção de moradores da Vila Autódromo, área desapropriada para a realização dos Jogos. O custo da retirada das pessoas já passa de R$ 80 milhões, e esse dinheiro sairá dos cofres da prefeitura. Contudo, esse é um custo que ainda não foi disposto no orçamento.
O mesmo vale para uma conta de R$ 100 milhões anunciada pelo governo federal em fevereiro de 2015 para comprar bolas, redes, obstáculos e barcos para a Rio-2016. Gastos como os R$ 14 milhões alocados na limpeza da Baía de Guanabara são igualmente ignorados no custo total dos Jogos.
9 - Algum custo sofreu redução entre uma atualização e outra?
Sim, a revisão de custos dos Jogos teve algumas respostas otimistas. É o caso da Arena do Futuro, casa do handebol (olímpico) e do goalball (paraolímpico). “A gente tem uma alteração significativa por redução de manutenção e desmontagem. A prefeitura transferiu a responsabilidade para o privado, e isso deixou de ser um ônus para o setor público”, disse Marcelo Pedroso.
10 - Existe alguma preocupação com o cronograma de obras?
Ao menos publicamente, a resposta até o momento é não. As obras das arenas de tênis e hipismo, que estavam sendo tocadas pela construtora Ibeg e foram paralisadas em meio a um embate judicial envolvendo empresa e prefeitura, não têm qualquer menção a isso na matriz de responsabilidade.
“Elas estão sendo realizadas. A responsabilidade é da prefeitura, e não da Ibeg. A prefeitura terá outro prestador de serviço para concluir as obras. É tão momentâneo o que está acontecendo que não faria nem sentido colocar como obra paralisada, e na metodologia a gente nem considerou essa possibilidade. A prefeitura garante que vai me entregar dentro do prazo, e a matriz não considera esse tipo de paralisação”, explicou Marcelo Pedroso.
Como existe o imbróglio judicial entre Ibeg e prefeitura e a construtora foi a única a cumprir as demandas da licitação, o novo responsável pela obra será definido via concorrência de urgência.
“O ideal, na verdade, era a Ibeg tocar a obra, mas eles começaram a fazer joguinho duro”, disse Eduardo Paes. “A gente tem duas empresas olhando o detalhe, mas antes de assinar contrato é preciso ver tudo. O que eu posso dizer é que a preocupação com isso é zero”, adicionou.
O principal motivo para tranquilidade das autoridades brasileiras sobre as obras paralisadas é o próprio andamento dos projetos. As arenas de tênis e hipismo já tiveram eventos-teste e demandam pequenas intervenções até os Jogos.
“A própria Ibeg diz que vai demorar três meses. Se for isso, podemos ter tudo pronto em abril. Melhor ainda”, finalizou Paes.
Como funciona o orçamento dos Jogos Olímpicos de 2016:
Arenas – R$ 7,07 bilhões (valor atualizado em 29/01/2016)
Legado – R$ 24,6 bilhões (estimativa de abril de 2015)
Comitê Rio-2016 – R$ 7,4 bilhões (valor atualizado em agosto de 2015)
CUSTO TOTAL – R$ 39,1 bilhões
Custo na candidatura – R$ 28,8 bilhões (em valores da época)
Custo da candidatura corrigido – R$ 44,39 bilhões (aproximado)
Custa da Copa de 2014 – R$ 27,1 bilhões
Custo de Londres-2012 – R$ 65,3 bilhões (câmbio atual)