Futebol

Teimosia com jogo de cintura faz Micale driblar pressão e reerguer equipe

REUTERS/Bruno Kelly
Após um início de torneio sem gols, Micale comemora sobre Neymar e Gabriel Jesus imagem: REUTERS/Bruno Kelly

Dassler Marques

Do UOL, no Rio de Janeiro

Nos conceitos de jogo, a palavra que resume Rogério Micale é teimosia. Ou, para os mais céticos, convicção. Mas foi o jogo de cintura e a simplicidade para driblar o início ruim de Olimpíada que fizeram com que o treinador praticamente sem experiência no futebol profissional virasse uma figura central na trajetória do Brasil até a decisão. 

Nos momentos de grande cobrança por melhores resultados, Micale perdeu o sono atrás de soluções e apareceu com os olhos abatidos e cansados para a entrevista coletiva na véspera de Brasil 4 x 0 Dinamarca. Preocupado que não houvessem vilões em caso de uma eliminação inesperada, ele mesmo assim não mudou sua linha de raciocínio. Considerado um treinador de ideias ultra-ofensivas, elevou esse conceito um nível acima. 

Com Luan, a seleção passou a ter quatro atacantes de origem juntos e justificou o lado teimoso de Rogério Micale. Por outro lado, o treinador mostrou flexibilidade ao abrir caminho para a presença de Tite por perto e ao aceitar a sugestão do auxiliar técnico Odair Hellmann para que Walace se tornasse o novo titular e desse mais estabilidade ao meio-campo.  

O volante do Grêmio, embora chamado por Dunga para a Copa América, não era um dos preferidos de Micale. Inicialmente, ele entendia que o estilo de jogo proposto para o Brasil era de certa forma pouco compatível com Walace. O corte de Fred às vésperas da Olimpíada por falta de liberação do Shakhtar-UCR causou grande lamentação no treinador, que completou o elenco com o gremista. Quase nunca usado como titular durante a preparação, ele virou um dos segredos para a volta por cima nos últimos três jogos. 

A volta por cima com Neymar ao lado

No vestiário, Micale driblou as instabilidades iniciais com uma relação próxima e franca com os atletas. Publicamente, jamais expôs qualquer jogador mesmo com o clima ruim após os dois primeiros empates. Neymar, que tinha um histórico de relacionamento ruim com Dunga, se tornou um de seus principais aliados.

Sem impor grandes cobranças e com defesa de uma relação franca e compreensiva com seu principal craque, o treinador contornou os problemas no início do torneio. O descontrole de Neymar após Brasil 0 x 0 Iraque fez com que Micale fosse internamente criticado por alguns colegas, mas a abordagem dele aos problemas que se apresentaram permitiram uma reviravolta positiva. 

As conversas ao pé do ouvido, seja com Neymar ou com os outros jogadores, são frequentes e ocorrem a qualquer pausa dos treinamentos. "Ele é um cara especial pra mim e sempre conversamos muito", disse Gabriel na última terça. "Ele é um cara muito legal, conversamos de vários temas e não só futebol, mas da vida particular e outras coisas além do futebol. Foi uma conversa de pai pra filho com um cara que admiro e respeito bastante", acrescentou sobre o treinador. 

Diante dos jogadores, Micale também ganhou ainda mais respeito e admiração após uma palestra que precedeu a goleada sobre a Dinamarca, em Salvador. Além de fazer cobranças e pedidos aos atletas, o treinador se emocionou pela possibilidade de todo o grupo fazer a história no torneio ou ficar marcado negativamente por outra decepção da seleção. Todos escolheram a primeira opção, e até Thiago Maia, que foi de destaque a reserva, ganhou um pedido de desculpas do treinador. 

Nos últimos dois jogos, a alegria de Rogério Micale tem transbordado, a ponto de dar um soco no ar para comemorar o segundo gol do Brasil nos 6 a 0 sobre Honduras ou de saltar sobre Neymar e Gabriel Jesus. Normalmente contido, o treinador se tornou o quarto a alcançar a final olímpica - após Carlos Alberto Silva, Jair Picerni e Mano Menezes - e foi premiado por suas convicções. Melhor ainda se, no sábado, bater a Alemanha e virar o primeiro campeão. 

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