Zagueira se recusou a tirar fotos de biquíni: "nada a ver com o futebol"
Suzana Rosseto, 23 anos, abdicou da coroa de musa do Rio Branco (ES) por não aceitar fazer caras e bocas para uma câmera usando um nano biquíni. O título veio no ano de 2011 em eleição no grupo do time no Orkut.
No ano seguinte, o concurso foi organizado pela TV Gazeta, afiliada da Globo no Espírito Santo. A emissora exigiu um ensaio fotográfico. Ela reclamou porque desejavam imagens sem relação com o futebol ou o ato de torcer.
(Esta reportagem faz parte do Especial #QueroTreinarEmPaz. Quando decide praticar esporte quase toda mulher enfrenta uma série de dificuldades que não deveriam existir. Dificuldades que homens não enfrentam. Se você, só porque é menina, já teve problema para praticar esporte, conte sua história nas redes sociais usando a hashtag #QueroTreinarEmPaz)
“Fotos de biquíni, eu não concordo. Não tem nada a ver com futebol. Não tem nenhuma parte do futebol que justifique aquelas posições”, afirmou.
Suzana não aceitava posar de “quatro apoios”. O presidente do time consultou a garota e questionou se poderia mandar outra representante. Assim foi feito.
Ela explica que era muitas vezes chamada de maria-chuteira e acusada de usar o corpo para se promover. Aceitar as fotos endossaria tudo que estavam falando.
Enquanto a outra candidata nunca apareceu no estádio depois do concurso, a frequência de Suzana foi bem diferente . Seguiu batendo ponto nas arquibancadas como fazia desde 2008, quando o irmão convidou para acompanhar uma final.
Foi um jogo contra a Desportiva, maior rival do Rio Branco, e ela se encantou com a vibe de um estádio. Com 14 anos, não fez feio e sabia o hino de cor. A letra estava na cabeça porque o irmão acordava a família com a canção nos domingos de manhã. Mas não significa que tudo era festa. Muitos homens destilavam preconceito.
“A gente sempre ouve. Até hoje (tem) aquele típico machismo de que mulher não sabe o que é impedimento”, contou.
Suzana conta que na época em que era uma raridade haver mulheres nas arquibancadas o ambiente conseguia ser ainda mais hostil. Momentos constrangedores se multiplicavam.
“Olhadas, secadas, cantadas baratas. A gente finge que não ouve", relatou.
A realidade intimidadora nunca afastou Suzana do estádio. Seria errado deixar algo que gosta porque outras pessoas não sabem se comportar. Com este pensamento, ela cresceu na hierarquia da organizada do Rio Branco.
Quando o clube resolveu dar espaço aos torcedores, foi convidada para ser a primeira conselheira da história da equipe. Cargo aceito. Suzana zela para a equipe não montar elencos fracos. Mas também sabe que as coisas precisam melhorar fora das quatro linhas.
Suzana foi inclusive vítima de preconceito quando jogava futebol de areia. Ela se define como uma zagueira raçuda de mais transpiração do que inspiração. O desempenho em campo não era assunto para os vizinhos. Eles se mobilizavam para alertar o pai que uma moça jogar bola era o caminho para virar lésbica.
“A gente tem um comércio no bairro, as pessoas conhecem a gente. E, às vezes, chegavam no meu pai conversas que algumas delas estavam preocupadas comigo”, contou.
Suzana disse que - em quase dois anos de time, parou porque machucou o pé - conviveu com o rótulo de machona. A ex-zagueira sabia dos comentários que aterrissavam nos ouvidos do pai. Era aconselhada a manter a tranquilidade, mas sabia que ele se incomodava com a situação.
“Ficava brabo de fazerem fofocas, mas dizia deixa pra lá porque não tem jeito”, relatou.