Paraolimpíadas

"Esporte paraolímpico ainda não mudou preconceito no Brasil", diz ex-chefe da delegação brasileira

Acervo Pessoal
Alberto Martins da Costa esteve à frente da delegação brasileira em três Paraolimpíadas imagem: Acervo Pessoal

Jefferson Puff Da BBC Brasil, no Rio de Janeiro

Mas sucesso dos Jogos já atrai interesse de deficientes para modalidades paraolímpicas, diz Alberto Martins da Costa.

Apesar do sucesso das Paraolimpíadas, a sociedade brasileira ainda não mudou o preconceito em relação aos deficientes e o esporte olímpico. Essa é a opinião de Alberto Martins da Costa, que esteve à frente da delegação brasileira em três Paraolimpíadas - Sydney (2000), Atenas (2004) e Pequim (2008).

Porém, ele acredita que o país esteja "próximo" de mudar seus paradigmas – com a a ajuda do esporte. "O que você está vendo nessas competições não é a deficiência física, é a superação de si mesmo na busca da melhor performance. É a obtenção de marcas, dos melhores tempos, de quebra de recordes, da vitória sobre os adversários."

Doutor em Educação Física, ele já não chefia os atletas: atualmente, preside a Academia Paralímpica Brasileira, criada em 2010 para agregar os estudos em torno do esporte paraolímpico no país.

Em entrevista à BBC Brasil, Costa afirma que já é possível perceber reflexos do sucesso do evento junto a muitos deficientes físicos, que têm entrado em contato com a Academia para buscar informações sobre como ingressar no esporte.

Veja os principais trechos da entrevista:

BBC Brasil - Que tipo de impacto real o senhor acredita que ter sediado os Jogos pode trazer para os deficientes físicos no país?

Alberto Martins Costa - Muitas pessoas no Brasil nem sabiam que o esporte paraolímpico existia. Sediar os Jogos aumentou a visibilidade e já estamos percebendo um reflexo disso.

Desde o início da Paraolimpíada temos recebido na Academia Paralímpica Brasileira e no Comitê Paralímpico Brasileiro uma série de demandas e emails de deficientes que estão assistindo aos Jogos e nos questionam sobre como fazer para ingressar no esporte.

Muitos ídolos que temos hoje, como o nadador Daniel Dias, e outros que conquistam diversas medalhas, também se espelharam em atletas paraolímpicos para começarem suas carreiras.

Nossa orientação é de que procurem associações para pessoas com deficiências em suas cidades e Estados e que tomem o primeiro passo para iniciarem a prática do esporte.

BBC Brasil - Muitos deficientes se queixam de preconceito e falta de políticas públicas, como calçadas e ônibus adaptados e mais chances profissionais. Como o senhor vê a questão?

Costa - É fato que a sociedade brasileira ainda tem preconceito contra o deficiente físico e o atleta paraolímpico. Não só no Brasil mas também em outros países estamos próximos de uma mudança de concepção, mas ainda precisamos avançar mais, e o esporte ainda não mudou este preconceito.

No entanto, é preciso dizer que o esporte é o principal instrumento para essa nova forma de a sociedade encarar essas pessoas. O próprio conceito de esporte paralímpico como a atividade desenvolvida por atletas de alto rendimento, de alta performance, que se submetem a intensos treinamentos para alcançar suas metas, é uma mudança importante.

Não se trata de um olhar de pena. O que você está vendo nessas competições não é a deficiência física, é a superação consigo mesmo na busca da melhor performance. É a obtenção de marcas, dos melhores tempos, de quebra de recordes, da vitória sobre os adversários.

Precisamos parar de bater nessa tecla da deficiência e mudar a concepção de esporte paralímpico para esporte de alta performance, de alto rendimento, seja ele praticado por pessoas com ou sem deficiência.

BBC Brasil - Um jornalista português usou termos fortes ao afirmar que os Jogos Paraolímpicos são um "espetáculo grotesco" e que servem "apenas para preencher a agenda do politicamente correto". Como o senhor responderia a isto?

Costa - É uma opinião extremamente infeliz, de quem não conhece o esporte paraolímpico, não sabe o que está por trás dele, não sabe o que ele traz para as pessoas que praticam essas modalidades, e desconhece o fato de que o esporte paraolímpico é a principal ferramenta para mostrar a capacidade e a potencialidade das pessoas com deficiência. Demonstra falta de conhecimento dele não só sobre o esporte paraolímpico mas sobre a vida das pessoas com deficiência.

BBC Brasil - Como o senhor explica o bom desempenho do país nos Jogos Paraolímpicos?

Costa - Há uma série de fatores. O primeiro são os atletas, a qualidade dos nossos competidores e o treinamento que realizam. O segundo é a organização administrativa do desporto paralímpico no país. Temos um bom planejamento de metas, que se mostrou eficiente nos últimos dois ciclos (Londres e Rio), e o cumprimento do investimento planejado para o esporte. O fato de o Brasil ter fechado a Paraolímpiada de Londres na 7ᵃ posição geral e ter colocado como meta fechar entre os cinco primeiros no Rio de Janeiro também motivou esse sucesso.

BBC Brasil - Entre as modalidades paraolímpicas há destaque para o atletismo e a natação, que costumam dar os maiores números de medalhas para o Brasil. Como o senhor explica a diferença em relação aos outros esportes?

Costa - Pelo grande número de provas e categorias, é natural que tenhamos número maior de medalhas para o Brasil nestes dois esportes. Por outro lado, são modalidades que não exigem uma gama de equipamentos e aparato técnico quanto as outras, e portanto os nossos paratletas podem treinar e se aprimorar sem grandes problemas. É muito mais fácil formar paratletas nestes dois esportes em comparação a outros.

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