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Roberto Salim

Histórias do jovem Havelange: amigo de Didi e vendedor de pastas de dente

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Roberto Salim

Roberto Salim, repórter da Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, Gazeta Esportiva, Última Hora, Revista Placar, ESPN Brasil. Cobriu as Olimpíadas de Barcelona, Atlanta, Sydney, Athenas, Pequim e Londres. Na ESPN Brasil realizou mais de 200 documentários no programa 'Histórias do Esporte', ganhando o Prêmio Embratel com a série 'Brasil Futebol Clube' e o Prêmio Vladimir Herzog.

Colunista do UOL

Muitas histórias vão ser contadas agora que João Havelange se foi. Mas algumas são apetitosas e não tem nada a ver com o mundo da bola. Outras são o início de um garimpo puro em direção à FIFA. Vamos começar com o nadador e jogador de polo aquático. Nessa fase que durou até o Pan-Americano de 1955, ele chegou até a pegar tifo numa travessia de São Paulo a nado, no rio Tietê.

“O João era muito bom para nós, nos ajudava em tudo que era necessário. Você sabe, na minha época o atleta era amador e não tinha dinheiro na jogada”, relembrava na manhã desta segunda-feira a atleta Wanda dos Santos, que esteve na Olimpíada de Helsinque.

“Ele estava sempre conosco nas competições... eu estou muito triste com a notícia”.

A data da morte de João coincide com um dia histórico para o polo aquático nacional. Dia em que o Brasil enfrenta a Croácia. Além de ter defendido a seleção, João Havelange também deu o maior presente já recebido pelo polo nacional.

“Foi ele quem trouxe o meu pai para jogar no Fluminense”, contou Izabella.

Ela é filha da lenda Aladar Szabo, o maior jogador que o país já teve.

“O João Havelange foi buscar o meu pai na Itália.”

A história de Szabo é de filme.

“Meu pai fugiu da revolução comunista na Hungria, na caçamba de um caminhão. Foi para a Itália e jogava em Nápoles. O João já admirava o meu pai, queria trazê-lo para desenvolver o pólo no Brasil”.

O convite era para Szabo ser treinador do Fluminense, mas quando ele chegou nas Laranjeiras, apesar da idade, todos viram que ele era melhor que o time inteiro do tricolor.

“Fizeram a proposta para ele continuar jogando, foi da seleção, ganhou Pan-americano e fez história. Meu pai ficou no Flu durante anos, graças ao Havelange”.

Outra história de filha com pai e João Havelange vai ser contada agora por Lia Hebe. Ela morava com sua família e o grande Didi em Jeddah. Foi ela quem atendeu um telefonema de João Havelange querendo falar com seu pai, que era técnico do Al Ahli.

“O seu João queria que meu pai abrisse o mundo árabe para ele, a fim de facilitar sua caminhada rumo à presidência da Fifa. E naquela época meu pai era um Deus em Jeddah”.

Didi era adorado pelo príncipe Khalid Bin Abdulahzis, que era o presidente do Al Ahli.

“Além disso era o chefe da polícia, tinha o comando de tudo. Ele aceitou a proposta de João Havelange para fazer um amistoso com a seleção brasileira e isso abriu o caminho para que o seu João tivesse os votos do mundo árabe”.

Didi e João Havelange eram amigos do tempo de Fluminense. Tempos em que outro amigo de Havelange, João Gonçalves, era nadador, namorava a saltadora Wilma, e João já estava acabando a carreira de jogador de polo aquático.

“Eles tinham 18 anos de diferença, a gente conversava, convivia, mas quem vai contar história melhor sobre o João é o meu padrinho de casamento, o Willy Otto Jordan, que era amigaço dele” – passa a bola dona Wilma, que também defendeu o Brasil em Pan-Americano, nos saltos ornamentais e foi casada com João Gonçalves por 50 anos.

Willy Otto está com 96 anos. Nadou ao lado do amigo por muito tempo, por isso a família tratou de dar a notícia do falecimento com cuidado.

“Eu conheci o João em 1933. Ele tinha 17 anos e eu tinha 13. Ele veio para a inauguração da piscina do Clube Germânia, em São Paulo”, relembrou logo pela manhã na capital paulista, o senhor Otto, com a memória intacta.

“Ficamos amigos desde então”. Amizade que se estreitou quando João Havelange

foi trabalhar em São Paulo e ficou por 12 anos.

“Ele era representante de uma fábrica de pasta de dente e competia pelo Espéria”.

Na Olimpíada de Londres, o nadador Otto participou de duas provas. “Fiquei em sexto nos 200 metros borboleta e quarto no revezamento 4x200 metros”.

Vai lembrando fatos, o nome de dona Ana Maria, esposa do amigo, dos encontros em Miami e da Olimpíada de Munique, em 1972, que ele assistiu ao lado de João. Para terminar, ele faz questão de falar sobre o Havelange presidente da Fifa:

“Muitos questionaram os métodos dele para dirigir a Fifa, mas ele assumiu a entidade com 35 países e a deixou com mais de duzentos. A verdade é que os métodos funcionaram: tirou a Fifa das mãos de um inglês e a transformou numa federação universal”.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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