Coluna

Roberto Salim

A história do ciclista brasileiro que se dopou até com remédio de cachorro

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Roberto Salim

Roberto Salim, repórter da Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, Gazeta Esportiva, Última Hora, Revista Placar, ESPN Brasil. Cobriu as Olimpíadas de Barcelona, Atlanta, Sydney, Athenas, Pequim e Londres. Na ESPN Brasil realizou mais de 200 documentários no programa 'Histórias do Esporte', ganhando o Prêmio Embratel com a série 'Brasil Futebol Clube' e o Prêmio Vladimir Herzog.

Colaboração para o UOL

Às vésperas dos Jogos Olímpicos, um dos assuntos mais comentados é o da utilização de métodos proibidos para se alcançar a glória. Será que o grande campeão usa ou não anabolizantes? Tomou furosemida para mascarar uma substância condenada? Fugiu ao controle? Até que ponto só os russos são culpados neste mundo milionário dos patrocinadores do esporte?

A entrevista que o português Luís Horta deu ao “Lance” afirma que o Comitê Olímpico Brasileiro e o Ministério dos Esportes sufocaram o trabalho de combate ao doping realizado pela Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem. Ele foi da ABCD e disse que os dirigentes agiram assim pois querem o maior número de medalhas: limpas ou não.

A verdade é que a Olimpíada está aí.

E o doping também.

Por isso, eu vou relembrar aqui, a reveladora e incomum entrevista que ajudei a fazer no fim do ano passado para o documentário “A corrida do doping”. Com a palavra, o ciclista Alex David Mayer Arseno que, em 2015, foi apanhado pela segunda vez com a substância erotropoetina em seu exame e acabou banido do esporte.

Ao contrário de todos que fogem à realidade: Alex escreveu uma carta aberta aos amigos e fãs, esclarecendo tudo. “Queridos amigos, Ao longo de 17 anos de carreira, entreguei-me com todo o meu ser a um esporte que nem sempre recompensa o esforço e o desprendimento que a ele dedicamos...”

Assim começava a carta de Alex, que está se formando professor de Educação Física e pretende dar palestras aos jovens, para que seu exemplo não seja seguido como competidor.

“Sou fruto da época em que vivi”, escreveu corajosamente, admitindo que o uso das substâncias proibidas é mais comum do que as pessoas querem acreditar.

Eu participei da entrevista que Alex deu na manhã do dia 27 de novembro ao lado dos companheiros jornalistas Paulo Markun e Kitty Balieiro.

O documentário “A corrida do doping” já está nas telas. O filme é uma co-produção franco-brasileira: de um lado a produtora Revanche e do outro a equipe do francês Xavier Deleu.

Um dos pontos mais impressionantes da entrevista do ciclista é a leitura da carta, feita com emoção. Em alguns momentos, na gravação, ele parava, respirava, parecia que ia chorar e seguia em frente. Lendo. Mas a grande revelação feita não está presente no documentário. Simplesmente porque não foi gravada.

“Tomei vários tipos de substâncias proibidas: uma vez passei tão mal com o remédio que tomei, que nem consegui competir”.

Mas ainda não foi essa a frase mais chocante. A pior de todas, dita pelo ciclista de 32 anos, sem escolher as palavras, é que ele tomou até remédio veterinário para melhorar sua performance. E esta frase não foi gravada, porque quando ele a pronunciou, uma moto barulhenta estacionou no Mirante da Serra de Campos de Jordão, onde os ciclistas da região realizam seus treinos mais fortes. Na hora, a câmera foi desligada.

“Tomei até remédio para cachorro”.

Sim, remédio para cães.

Assim é o mundo do esporte de alto nível, do qual Alex – atleta de alto rendimento - foi banido.

“Estou me despedindo com profunda dor e arrependimento”, admitiu Alex, na parte final de sua carta.

A grande festa do esporte está só começando.

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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