O suor feminino vale menos: Lei não protege atletas de preconceito salarial
Como me dói que tão poucas brasileiras possam, como eu, atingir um cargo de direção. Se tem um progresso que sonho em assistir antes de deixar a Comissão de Direitos Humanos da OAB do Distrito Federal é este, que também é um direito humano: que as pessoas sejam pagas baseadas no trabalho que fazem e não em seu gênero. Segundo o IBGE, nós brasileiras ainda ganhamos 30% a menos que os homens pelo mesmo trabalho.
Às vésperas das Olímpiadas, é especialmente inevitável pensar em nossas atletas que ganham comissões gritantemente inferiores aos masculinos, sofrem discriminação relacionada à maternidade e são vítimas de assédio sexual e moral. Vale lembrar que na lista dos 100 atletas mais bem pagos do mundo apareciam apenas duas mulheres. Cabe aqui a pergunta: se a Constituição Federal atesta que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, não seria ilegal pagá-los quantias diferentes pelo mesmo trabalho? Ou os 45 minutos de bola rodada das mulheres são menos dignos que o mesmo tempo nos jogos masculinos?
E a resposta é que, infelizmente, não há nenhuma lei que determine que os salários das mulheres atletas devam ser obrigatoriamente iguais aos dos homens da mesma categoria.
Ao atleta profissional aplica-se as normas gerais da legislação trabalhista e da seguridade social. A Lei nº 9.615/98, que institui as normas gerais sobre os esportes, impõe aos atletas a celebração de contrato de trabalho por tempo determinado, sendo cada um deles distinto e independente do anterior. Portanto, as partes podem estipular as cláusulas contratuais livremente a cada novo pacto, inclusive os salários.
Sendo assim, no Brasil, os atletas e entidades de prática desportiva são livres para negociar o valor do salário confirme convir. E o machismo pode correr solto sem penalidade alguma.
Inúmeros argumentos são elencados para justificar o injustificável. Um deles é que os atletas homens atrairiam um público maior e, consequentemente, mais patrocinadores. Talvez esse ponto seja verídico circunstancialmente, mas é impossível generalizar. Há esportes que atraem um público maior a depender do sexo dos atletas, outros não. Além disso, se o público tem preconceito contra esportes femininos, nosso papel é combatê-lo e não nos calar diante dele.
De fato, o mercado dos esportes nacionais e internacionais movimenta cifras bilionárias e a audiência é crucial para o pagamento dos atletas, mas aceitar de braços cruzados que as mulheres ganhem menos, apesar da mesma dedicação, treino e habilidades técnicas, é aceitar o sexismo secular. É aceitar que a atleta seja discriminada e menosprezada pelo simples fato de ser mulher. E se o papel do Estado não é proteger 51% de sua população contra abusos deste tipo, seria o quê?
*Lívia Magalhães é presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/DF, conselheira seccional da OAB e sócia proprietária do escritório Lívia Magalhães Advocacia. Acumula também o cargo de advogada da Revista AzMina