Paratletas não ligam para gafes como a de Galvão e até brincam entre si

Felipe Pereira
Do UOL, em São Paulo

Galvão Bueno ouviu poucas e boas nas redes sociais durante as Olimpíadas por pedir para todos ficarem em pé sem perceber que o atleta Fernando Fernandes estava presente, na cadeira de rodas. Na Copa do Mundo, Fernanda Gentil estendeu a mão para cumprimentar um cego que, obviamente, não percebeu e deixou a apresentadora no vácuo.

Lógico que ambos ficaram muito sem graça. Mas entre os paratletas brincadeiras são comuns e eles lidam muito bem com isso. Os cadeirantes se acostumaram a ouvir que devem ficar em pé na hora do hino. As piadas são comuns e ninguém se ofende por saber que há respeito. Quando a gafe vem de fora, a situação é diferente.

Porque os globais não são os únicos a dizer coisas inapropriadas. Muitas pessoas adotam termos que podem soar agressivos sem perceber. A situação ocorre por falta de costume em lidar com portadores de deficiência, mas quase sempre não há maldade na atitude, avaliam os paratletas que defenderão o Brasil nas Paraolimpíadas do Rio-2016.

Desta maneira, não se sentem ofendidos. Principal jogador do time de futebol de 5, formado por cegos, Ricardinho acredita que atitudes como a de Galvão e Fernanda Gentil acontecem na empolgação do momento.

“Não me incomoda de falar olha aí, assistir à TV. Eu mesmo falo: 'vi tal programa'”.


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Ricardinho conta que presencia gafes e costuma reagir com descontração porque raramente vê intenção de magoar. O paratleta também explica que é natural as pessoas falarem assistir televisão. Completa que fica complicado cortar do vocabulário os verbos ver e olhar.

Mas brincadeiras maldosas ainda existem afirma Jefinho, também da seleção de futebol de 5. Ele explica que é possível perceber a intenção das pessoas pelo tom de voz e a circunstância em que a brincadeira ocorre.

“Depende de como acontece. Às vezes, passa na rua e chamam de ceguinho. (Você) Leva em consideração o tom de voz, se for pejorativo complica”.

Eliseu dos Santos foi bronze na bocha em Londres-2012 e, por ter dificuldade em andar, na escola sofria bullying. Na época, queria brigar. Hoje, reage de forma pacífica.

O paratleta acredita que o mundo evoluiu e a maioria faz como Galvão Bueno, usa termos inapropriados sem perceber e sem maldade. Prova disso, é que os autores da bola fora ficam muito sem graça na sequência.

“É igual ao Galvão, que não tava zoando ninguém. O Galvão foi na empolgação, depois que viu. Mas aí já tinha falado”.

Entre paratleta a zoeira é liberada

Quando estão entre iguais, os paratletas fazem muitas brincadeiras entre si, revela Eliseu. Ele conta que algumas são clássicas como as pessoas que, como ele, estão em cadeiras de rodas ouvirem um “levanta aí” na hora de execução do hino nacional. Avião é outro lugar de piada pronta.

“Quando aterrissa e a voz fala para ficar sentado até a aeronave estar completamente parada, a gente fala para não levantar antes da hora”.

Pela regra não escrita da zoeira, nada fica barato. Os cegos precisam são questionados sobre cenas que aparecem na televisão ou alertados para olharem determinado fato que acontece nas proximidades. Eliseu explica que o convívio permite estas atitudes.

“A gente tem esta liberdade. Sabemos que nos respeitamos.”