Triatlo vira prova de resistência para público por causa do calor

Luis Augusto Simon
Do UOL, no Rio de Janeiro
UOL
O holandês Roel reclamou da cerveja brasileira

O celular só pode estar com defeito. Aponta 29 graus, às 11h, no Forte de Copacabana, onde 55 atletas começam a disputar o triatlo da Rio-2016. Dois deles, os irmãos britânicos Alistair e Jonathan Brownlee completam o 1,5 km de natação, os 40 km de bicicleta e ainda 10 km de corrida na casa de 1h45min.

A sensação de calor é muito maior. Os sargentos Ribeiro e Nascimento, da Força Nacional, buscam uma pequena sombra, à beira de uma placa publicitária. Uma nesga, que ajuda a enfrentar o suplício. “Para mim, está mais de 45 graus. Talvez seja pela roupa, que pesa 25 kg, juntando coturno, armamento e colete à prova de bala”, diz Ribeiro, que é de Goiás.

Nascimento tira uma onda. “Meu amigo, se você for a Teresina, Rondônia, Roraima ou no meu Maranhão, vai achar que aqui está morno”, afirma, sem abandonar um milímetro que seja de sua sombra.

Existe um latifúndio de sombra para a família olímpica. Alguns quiosques reservados, de frente para a praia, onde elegantes senhores e senhoras, desfrutam de bebida e comida à vontade. Cerveja, refrigerante, água, iogurte, salada, salgadinho, sanduíche de patê com queijo, castanhas, tudo a amenizar a os tais 29 duvidosos graus.

A comida está boa, presidente?

"Não experimentei, apenas água”, responde o suíço Thomas Bach, que deixa por minutos o enclave olímpico em Copacabana para tirar fotos com os atletas correndo ao fundo.

Fora dali, onde ficam repórteres e o público, uma garrafa de água de meio litro custa R$ 8. E um refrigerante, R$ 10. Ao atravessar a rua, onde correm os atletas, chega-se à Avenida Atlântica e seus bares seguidos um ao outro, também com preços altos.

A exceção é Marizilda, parada na calçada, com um isopor cheio de gelo e bebida. Um olho no troco e outro no rapa, que pode chegar a qualquer momento. ‘’Só os bares podem faturar? Também tenho meu direito de viver”, diz ao receber uma crítica ácida da freguesa: “cinco reais um refrigerante? Eu pedi um e não foi uma dúzia, não”.

Luis Augusto Simon/UOL
Nancy é carioca e foi assistir ao triatlo
Ela explica que antes da Olimpíada era R$ 4 e que precisou aumentar. Não, não posso vender com desconto para brasileiro, sinto muito.

“Para mim, o preço está bom, ruim é a cerveja do Brasil”, diz o exigente holandês Roel, de bermuda e chapéu com algumas pequenas tulipas.
As pessoas, grande maioria, estão vestindo bermudas e bonés. Otavio Bonilla, fotógrafo mexicano, acrescentou ainda óculos escuros e um lenço azul no rosto. “Está muito mais quente que no México. Não estava preparado”. Nancy – é com y, não esquece - Ribeiro – é carioca da gema e adotou visual parecido com o mexicano.

Muita gente se dá bem no calor. Grita, vibra, incentiva os atletas. Parecem estar em seu habitat natural.

Luis Augusto Simon/UOL
Luis Mayer é voluntário no Rio e veio do Rio Grande do Sul
Não é o caso do viking Luis Mayer, voluntário do Rio Grande do Sul. Apoiado na grade, procura saber sobre o desempenho de noruegueses, suecos e dinamarqueses.

Ao frequentar encontros da família Mayer, no Rio Grande do Sul, viu que o brasão remetia aos países nórdicos. Então, se assumiu como descendente viking. É baixo, mas tem olhos azuis e cabelo nos ombros. Com boa-vontade, um mini Thor. “Por causa desse cabelo grande fui proibido de entrar nos EUA para ver a Olimpíada de Atlanta. Também perdi vários empregos”.

Aos 58 anos, está perto de se aposentar como educador físico. Então, visitará suas raízes. “Vou dar a volta ao mundo. Tenho um fusca e dentro dele, uma cama de casal de 1,82m. Ela é tri articulada, como uma asa delta. Fica por cima dos bancos, mas sem encostar neles. Também tenho um jipe com cama dentro. E estou fazendo um triciclo. Ainda não sei como vou viajar, vai ser com um dos três”.

Enquanto isso, gastou R$ 8 mil para trabalhar como voluntário na Olimpíada. “Minha ideia era ficar no atletismo, mas não deu. Hoje, pelo menos, estou no triatlo, que também é da área.

A prova vai terminando, para tristeza do advogado Daniel Marques, que pratica o triatlo 70,3, com 1,9 km de natação, 90 km de bicicleta e outros 21 km de corrida. Irá ao Mundial da categoria, dia 4 de setembro. “A gente começa a fazer e não para mais. A meta é fazer um ironman”. No caso, o dobro do 70,3.
Camisa do Flamengo, Ricardo, ao lado da mulher, Renata e do pequeno Artur – só podia ser – de um mês, começa a deixar a torcida. “O menino aguenta o calor, mas eu, que sou atleta amador é que estou sentindo. Estou indo”.

Imagine então para repórter acima do peso, com calça jeans e camisa preta!