! Mulher Maracujá adota família olímpica na Rocinha e mostra o Rio como ele é - 16/08/2016 - UOL Olimpíadas

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Mulher Maracujá adota família olímpica na Rocinha e mostra o Rio como ele é

Luiza Oliveira

Do UOL, no Rio de Janeiro

Não são nem 10h e a Mulher Maracujá surge na laje de meia arrastão, mini saia e toda trabalhada na maquiagem. Ela já bota o funk no talo e faz a festa dos gringos que lotam o alto da favela da Rocinha - a vista é para a praia de São Conrado. É com essa animação que ela recebe seus hóspedes. A mais nova convidada é a norte-americana Dudley Voight, que já está pronta para entrar no ritmo. Ela não tem muito traquejo e também não entende a letra da música. Mas ensaia um rebolado ou outro tentando imitar a dona da casa.

Enquanto isso, em algum lugar do Parque Olímpico, o irmão de Dudley, Will Voight, está concentrado. Ele comanda a seleção masculina de basquete da Nigéria que perdeu para o Brasil na segunda-feira. O time dele está eliminado dos Jogos. Mas deve estar incomodado mesmo por não estar se divertindo como a irmã.

“Ele está muito focado no treinamento porque a Nigéria é pequena em sua estrutura olímpica, e Will teve que fazer vários preparativos, como cuidar da viagem. Ele não viu nada no Rio. Eu acho que ele está com um pouco de inveja de mim que eu estou aqui fora, posso escutar música, ir à praia, estar aqui na Rocinha”, diz Dudley, que pretende levar o irmão para dar umas voltas quando os Jogos acabarem. “Ele vai ter um pouco de tempo. Ele vai gostar daqui, é muito interessado em outras culturas, isso é parte do trabalho dele”, completa.

Marcela Sevilla
imagem: Marcela Sevilla

Dudley veio ao Rio para prestigiar o irmão, mas não queria viver na bolha da Olimpíada entre estrangeiros empolgados e arenas imponentes. O negócio é mergulhar na realidade do carioca, viver uma real experiência da comunidade. Por isso, deu um toco em todos os preconceitos, da zika à violência, e decidiu se hospedar na casa de um morador da Rocinha.

“Eu escolhi ficar aqui na Rocinha porque eu queria estar onde está o carioca real e ver como é a vida dele. Eu queria estar onde eu poderia escutar os sons, sentir os cheiros, provar o real gosto da vida no Rio. É muito vibrante, aqui tem muitas atividades. Certamente não é assustador", explica a norte-americana, que relativiza os alardes sobre criminalidade na cidade olímpica. "Eu sei que a mídia gosta de achar histórias. Nós podemos estar com medo. No meu trabalho nos Estados Unidos, eu encaro pobreza e violência todo dia. Não é exclusivo do Rio. É diferente quando você não sabe e não é familiar. Eu não sinto medo. Se eu sentisse [medo], eu não estaria aqui”, afirma.

Dudley chegou à Rocinha depois de pesquisar sobre a comunidade na internet. Ela encontrou o Favela Experience, que tenta fazer um intercâmbio entre moradores locais e estrangeiros. A ideia do projeto é quebrar preconceitos e mostrar a favela de um ponto de vista diferente.

Talvez ela só não esperasse uma anfitriã tão exótica, que recebe hóspedes desde a Copa do Mundo e quer faturar com a Olimpíada. No dia a dia, Maria Clara dos Santos é uma senhora de 50 anos que cuida da casa e vende ervas medicinais. Mas a qualquer momento ela pode se transformar na Mulher Maracujá. Ela dá um banho em qualquer mulher fruta, mas naquele corpinho não tem silicone, nem bumbum sarado. É tudo caído mesmo, como manda a batida do funk: ‘Peito caído, cheia de varize e a bunda toda murcha’.

Luta contra o machismo

Ela é Maracujá, mas rema contra a maré no mundo de mulheres frutas. O negócio é satirizar a objetificação do corpo feminino e levantar bandeira contra o machismo. As criticas são à vaidade excessiva e à busca por um padrão irreal de beleza que leva mulheres até a morte.

“A ideia da Mulher Maracujá é que temos que seguir a lei da natureza. Com 16 anos está toda bonitinha, dos 30 em diante começa a vaidade de querer esticar, vem as rugas. De 40 em diante, piorou. Às vezes é jovem, mas não tem bumbum adequado, vai fazer a barriga. O pobre só cresce a barriga quando começa a engordar, vai fazer lipoaspiração. Eu não acho isso certo, tem que seguir a lei da natureza”, afirma.

A Mulher Maracujá passa a lição até para os gringos que ficam hospedados em sua casa. O lema é respeito. E nada de pegar mulher na rua e levar para dormir na Rocinha. Quem não obedecer, vai levar bronca. Ela jura que já botou um gringo para fora.

“Eles falam que querem fazer aqui o que não podem fazer lá fora. Eu brigo. Aqui a lei é a mesma. Hoje em dia, aqui no Brasil, a maioria das mulheres está servindo de objeto sexual para obter alguma coisa. O hóspede vê a mulher como símbolo sexual, não respeita as mulheres brasileiras, e algumas se vendem por dinheiro, outras por copo de bebida, servindo o corpo de isca. Nós mulheres ficamos tristes, a mulher virou símbolo sexual na maioria do mundo”, reclama.

Luiza Oliveira/UOL
imagem: Luiza Oliveira/UOL

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