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Muçulmana ataca intolerância com bronze e rebate Trump: "divide americanos"

REUTERS/Lucy Nicholson
Esgrimista Ibtihaj Muhammad foi atração na Olimpíada por competir usando o véu "hijab" imagem: REUTERS/Lucy Nicholson

Bruno Freitas

Do UOL, no Rio de Janeiro

Ibtihaj Muhammad vai embora do Rio de Janeiro sem o ouro, mas pronta para assumir o papel de um ícone político do esporte. Muçulmana, a esgrimista foi a primeira atleta da história dos Estados Unidos a competir em uma Olimpíada vestindo trajes para cobrir a cabeça, de acordo com as tradições de sua religião. Mais do que isso, à parte de carregar o bronze no peito quando voltar para casa, a jovem deseja aproveitar a atenção que seu visual atraiu para ser ouvida como uma voz contra o preconceito em seu país contra seguidores do Islã – inclusive se levantando contra a plataforma eleitoral de Donald Trump.

"Essa é uma posição que Deus reservou para mim. Sempre me senti à vontade em me expressar. Queria contar a história real de quem são as mulheres muçulmanas. Queria mostrar a comunidade muçulmana por uma perspectiva positiva, em confronto com os sentimentos negativos que pessoas têm a respeito dos muçulmanos. Queria que as pessoas vissem desta maneira, comigo no pódio, representando os Estados Unidos. Queria as que pessoas enxergassem essa parte da história", afirmou Muhammad, em entrevista ao UOL Esporte.
 
Muhammad chegou até a esgrima na adolescência justamente por causa das vestimentas do esporte. Os pais da americana procuraram uma modalidade que pudessem combinar com a forma com que as mulheres muçulmanas se vestem, com o corpo coberto, inclusive a cabeça, através do uso do hijab (o véu muçulmano). "Algo em que eu não precisasse me trocar, que respeitasse os preceitos da minha fé", descreveu. No Rio, a identidade religiosa da atleta acabou transcendendo os limites olímpicos, graças ao momento de hostilidade crescente contra o Islã nos Estados Unidos.
 
"Eu sabia que viria para a Olimpíada como a primeira americana usando o véu. Sabia que haveria um agito em torno disso. Mas meu objetivo sempre foi competir no meu nível mais alto. Queria representar meu país da melhor forma e fico feliz que pude fazer isso", acrescentou a esgrimista, bronze com os Estados Unidos no Rio na disputa coletiva do sabre.
 

 

"Toda vez que você tem um candidato a presidente que usa sua plataforma para provocar divisão na sociedade, pra no dividir como americanos, pode ser prejudicial"

 

Mas o repentino papel de uma voz política dentro do esporte parece não intimidar a esgrimista de 30 anos. Ibtihaj Muhammad se posiciona com firmeza quando confrontada com as posições de Donald Trump sobre a comunidade islâmica, por exemplo. O candidato do Partido Republicano nas eleições presidenciais deste ano já manifestou em diferentes ocasiões que pretende barrar a entrada de muçulmanos no país, em nome da política de combate ao terrorismo dentro das fronteiras americanas.
 
"Toda vez que você tem um candidato a presidente que usa sua plataforma para provocar divisão na sociedade, para nos dividir como americanos, pode ser prejudicial. Vemos isso nos últimos meses aumentando os crimes de ódio e a intolerância. Vejo como isso mudou o jeito como as pessoas falam comigo através das mídias sociais. Precisamos começar um diálogo sobre os prejuízos de termos um discurso de ódio e ver a quem isso afeta. Precisamos fazer isso nessas eleições, rapidamente", opinou a esgrimista.
 
Pouco antes da notoriedade no Rio de Janeiro, Muhammad já flertava com a condições de referência da mulher muçulmana dentro do esporte. Nos últimos meses, a atleta da esgrima foi recebida pelo presidente Barack Obama na Casa Branca e, inclusive, teve oportunidade de dar uma aula informal de seu esporte para a primeira-dama, Michelle.
 
"Foi muito divertido conhecer o presidente e passar tempo com o casal. Adorei o fato de eles estarem nos apoiando, apoiando o movimento olímpico. Michelle disse que sempre via as Olimpíadas pela televisão. Não importava qual esporte, ela sempre estava torcendo pelos Estados Unidos. Isso é ótimo", descreveu a medalhista de bronze.
 
Nos Estados Unidos, Muhammad também trilha um caminho na direção da referência feminina, em termos de estética e atitude. A atleta foi recentemente incluída na lista das "100 pessoas mais influentes do mundo em 2016", preparada pela revista Time. De quebra, a americana ainda trabalha a identidade da mulher muçulmana através de uma grife de roupas. A medalhista olímpica é proprietária da Louella, marca que tem crescido unindo tendências fashion com tradicionalismo do islã. Segundo a esgrimista, a iniciativa nasceu para oferecer opções baratas para religiosas que tinham que buscar esse gênero de moda no exterior.       
 
Com Ibtihaj Muhammad, além de Mariel Zagunis e Dagmara Wozniak, a equipe americana de esgrima ficou com o bronze na disputa coletiva no sabre. O ouro no Rio ficou com a Rússia, enquanto que a prata terminou com o time da Ucrânia. 
 
"Honestamente, é a experiência mais surreal da minha vida. Não parece que aconteceu realmente. Eu fico olhando para baixo, no meu peito, para lembrar que ela (medalha) está lá. Esse foi um objetivo longo para mim e minha equipe. Trabalhamos muito por isso. Ganhar uma medalha olímpica... eu não trocaria por nada no mundo", disse a medalhista. 

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