Murray vence batalha de 4 horas contra Del Potro e ganha bi olímpico

Mauricio Stycer
Do UOL, no Rio de Janeiro

A semana dos sonhos do argentino Juan Martín Del Potro parou em uma muralha. O britânico Andy Murray chegou ao bicampeonato olímpico após uma batalha épica na final. Após quatro horas e dois minutos de jogo, Murray venceu Del Potro por 3 sets a 1, com parciais de 7/5, 4/6, 6/2 e 7/5, e levou a medalha de ouro.

A quadra central do Centro Olímpico de Tênis estava lotada para a final. Muitos argentinos compareceram, fizeram barulho e empurraram Del Potro como se fosse Copa Davis - ainda mais contra um adversário defendendo as cores do Reino Unido, o país que esteve em guerra com a Argentina três décadas atrás e até hoje controla as Ilhas Malvinas.

A atmosfera espetacular não assustou Murray, número 2 do mundo e campeão de Wimbledon, o último Grand Slam disputado nesta temporada do tênis. Del Potro, bronze em Londres-2012, que tinha a carreira dada como encerrada por muitos, volta a brilhar após três cirurgias no punho esquerdo. Ele derrubou dois gigantes em sua campanha no Rio de Janeiro: Novak Djokovic e Rafael Nadal.

Campeão em Londres, há quatro anos, o número 2 do mundo assegurou o quinto ouro em simples do Reino Unido, que já havia alcançado o lugar mais alto do pódio em 1896, 1900, 1908 e 2012. Ao lado de Laura Robson, em duplas mistas, ele também levou a medalha de prata em Londres.
 
A queda de Novak Djokovic, líder do ranking da ATP, diante de Del Potro na estreia deixou o caminho aberto para que o britânico chegasse ao título. O sérvio é a pedra no sapato de Murray na atualidade: nos últimos 15 confrontos entre eles, Djokovic venceu 13. 
 
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Murray é pouco festejado pelos brasileiros no início do jogo

Del Potro foi recebido pela torcida local na quadra central do Centro Olímpico de Tênis com gritos de "Mil gols! Mil gols! Mil gols! Mil gols! Mil gols! Só o Pelé! Só o Pelé! Maradona cheirador!", canção utilizada pelos brasileiros na Copa do Mundo de 2014 para responder ao marcante "Brasil, decime qué se siente".

O clima hostil e os gritos de "maricón" não representaram nenhuma novidade para Del Potro, acostumado às ofensas desde a partida em que bateu Djokovic, na primeira rodada.

Apesar de ser um dos tenistas mais importantes do circuito há quase uma década, Murray passou longe de ser festejado pelo público brasileiro como Djokovic ou Nadal, os principais astros do tênis olímpico.

Os torcedores que compraram ingresso para acompanhar a decisão se preocuparam mais em xingar Del Potro do que apoiar Murray.

Entre uma e outra "secada" em Del Potro, o público brasileiro também encontrou tempo para festejar Gustavo Kuerten, que estava na quadra central como comentarista da Globo.

1º set: um festival de oscilações

Poucos minutos de partidas foram necessários para que Murray mostrasse que pretendia chegar à vitória deslocando Del Potro pela quadra e variando o jogo para não ser castigado pelos potentes golpes do argentino da linha de base.

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No arrastado segundo game da partida, Murray, em sua terceira chance de quebra, anotou 2/0 e fez o adversário exibir sinais de cansaço.

Del Potro devolveu a quebra logo em seguida, mas não conseguiu manter a intensidade e foi muito incomodado pela solidez no fundo e as curtinhas do rival, que abriu 4/1 e passou a impressão de que venceria o set inicial com facilidade.

O argentino não baixou a guarda, viu Murray se enrolar em seu saque e fez 4/4. O confronto permaneceu equilibrado até o britânico abrir 6/5. Concentrado e contra-atacando com muita eficiência, o número 2 do mundo chegou a uma nova quebra e levou a primeira parcial por 7/5.

Del Potro distribui pancadas e leva o 2º set

Em diversos momentos da partida, Del Potro deu a impressão de estar cansado. Andando devagar ao final de cada ponto, quase se arrastando, como se estivesse economizando energia, ganhava tempo. E permitia que a torcida argentina fizesse a festa entre cada ponto.

Logo na abertura do segundo set, ele não chegou em uma curtinha do adversário e, desolado, encostou a cabeça na rede. Parecia um indício de que Murray teria vida fácil pela frente.

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Não foi o que aconteceu. Os dois tenistas exibiram ótimo nível técnico e construíram pontos emocionantes. Del Potro esbanjou categoria, conseguiu uma quebra no início do set e abriu 5/3.

Murray, até então fiel à sua estratégia de alongar os ralis e explorar a movimentação de Del Potro, começou a ser mais agressivo, mas esbarrou nos excelentes golpes do rival.

No décimo game, o argentino usou sua raquete como apoio, como se precisasse de um tempo maior de descanso entre os pontos. Nesse pequeno intervalo, os torcedores argentinos cantaram seu nome e fizeram uma festa enorme. Era o gás que Del Potro precisava para encerrar o segundo set com dois belos winners.

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Murray domina a 3ª parcial

Enquanto os dois primeiros sets tiveram 74 e 60 minutos de duração, respectivamente, a terceira parcial foi marcada pelo domínio total de Murray.

Ele conseguiu a quebra no sexto game e pulou na frente do rival, que teve dificuldades para reagir e errou demais. Focado, Murray cedeu apenas dois games ao rival e ganhou a parcial em 36 minutos.

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Um show de tênis no Rio

O quarto set foi um festival de pontos espetaculares e teve uma carga emocional alta para os dois jogadores.

Foram quatro quebras nos quatro primeiros games. Murray se defendeu como pôde das bolas chapadas e fundas de Del Potro, que pedia o apoio de seus compatriotas a cada belo ponto que fazia.

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Com 5/5, Murray esteve perto de perder seu saque, soube se recuperar e jogou muita pressão para Del Potro.

Murray se saiu bem em meio à tensão do último game e fechou em 7/5. Ao final da partida, Del Potro caminhou lentamente até a rede e deu um longo abraço no britânico. Em seguida, ambos se sentaram em suas cadeiras e, exaustos e chorando, cobriram os rostos com toalhas.

A luta de Del Potro contra seu próprio corpo

Em 2009, Del Potro, então com 20 anos, ganhou prestígio no mundo do tênis ao superar o suíço Roger Federer na decisão do Aberto dos Estados Unidos para vencer seu primeiro – e, até hoje, único – Grand Slam.

Diferentemente de seus compatriotas, que preferem o saibro, ele obteve seus melhores resultados em pisos rápidos.

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Apontado como um dos tenistas mais talentosos de sua geração, o argentino de 27 anos travou uma dura batalha contra as lesões. Del Potro passou por três cirurgias no punho esquerdo e chegou a cogitar a aposentadoria. Todo seu sofrimento durante a recuperação foi registrado em vídeos que o próprio atleta postava em suas redes sociais.

Ex-número 4 do ranking, Del Potro conquistou 18 títulos e hoje ocupa a 141ª colocação na lista da ATP. Ele luta contra seu próprio corpo para voltar a enfrentar de igual para igual os principais tenistas do circuito.