! Nem vida conturbada na família impede Biles de se tornar a atleta perfeita - 12/08/2016 - UOL Olimpíadas

Ginástica

Nem vida conturbada na família impede Biles de se tornar a atleta perfeita

Rodrigo Mattos

Do UOL, no Rio de Janeiro

Quando completou seu último exercício no solo, e garantiu o ouro olímpico no individual geral, a ginasta americana Simone Biles chorou. Foi uma surpresa para quem acompanha sua trajetória: não é costume ver em seus rosto emoções exacerbadas, apenas sorrisos de quem leva a vida sem preocupações. Uma descontração que contrasta com seus movimentos sem falhas e os percalços que enfrentou em seus 19 anos.

Ex-ginastas e especialistas no esporte apontam que Biles é quem mais se aproxima da série sem erros, da nota máxima. É verdade que a pontuação da ginástica mudou desde o 10 perfeito de Nádia Comaneci. Agora, há uma parte fixa e outra pelo nível de dificuldade de cada movimento. Dentro desse critério, Biles fechou um solo com nota 15,933, isto é, apenas 0,67 da perfeição no que se propôs. Sua vantagem sobre a segunda colocada foi de 2,100, a maior em uma final olímpica, superior inclusive à de Comaneci que reconhece ser Biles imbatível.

Questionada sobre sua vantagem, Biles dá de ombros: “Não sei como responder a isso (sobre a diferença). Nem sabia minha nota inteira até há pouco”, contou ela. “Às vezes nada passa na minha mente. Eu simplesmente entro e faço.” 

Essa facilidade de Biles de não se preocupar a fez deixar para trás uma infância turbulenta, um episódio de racismo em competição de ginástica, e um início vacilante na ginástica. Sua mãe Shannon Biles era viciada em drogas e álcool, e foi presa 20 vezes. Em um dos episódios, a assistente social decidiu que ela e a irmã menor Adria deveriam ser levadas para a adoção. O avô Ron e a avó Nellie decidiram adotá-la aos três anos, e se tornaram seus pais. Eram eles que estavam na Arena Olímpica ao lado da irmã.

Atualmente, Biles conversa com a mãe por telefone de vez em quando. “Eu não quis saber o que minha mãe fez. Mas esse era o estilo de vida dela antes de eu nascer”, afirmou em uma entrevista à Revista New Yorker. Nem uma controvérsia pública entre a mãe natural e o pai adotivo de Biles (seu avô) às vésperas da Olimpíada a afetou.

Assim como ignorou uma comentário da ginasta italiana Carlotta Ferlito, no campeonato mundial de 2013. Ao final, com o título de Biles, ela afirmou: “Eu disse para um colega que da próxima vez iremos pintar nossa pele de negra para poder vencer também”, disse. Depois, ela e a federação italiana pediram desculpas. Seu pai adotivo Ron resumiu a questão: “Não é a favor dela ser negra. No mundo que eu vivo o negro não tem vantagem.”

A questão racial sobre Biles permeia outra discussão que ela gerou. Fisicamente muito mais forte, a ginasta transformou o esporte com movimentos impossíveis para outras concorrentes, e que privilegiam a dificuldade do movimento do que o estilo e fluidez característicos das ginastas europeias. A nota perfeita que Biles persegue não é a de Comaneci - com beleza - representará o movimento impossível a qualquer outro ser humano, executado sem erros.

Já esteve muito próximo disso na final individual, e pode atingi-lo nos aparelhos onde almeja mais três ouros. Isso não causa, no entanto, nem uma contração no rosto da adolescente de 19 anos Biles. “Meus pais sempre sonharam (com o ouro olímpico). Eu não levava a sério o meu sonho olímpico. Só há dois anos que levei a sério.” 

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