Máfia de cambistas vende ingressos olímpicos reservados a Comitê Irlandês

Hanrrikson de Andrade e Vinicius Konchinski
Do UOL, no Rio de Janeiro
Tasso Marcelo/AFP
Polícia expõe ingressos reservados à Irlanda apreendidos com susposto cambista no Rio

A quadrilha internacional de cambistas investigadas pela Polícia Civil do Rio de Janeiro pôs à venda ingressos reservados ao Comitê Olímpico da Irlanda. Bilhetes nominais à entidade foram apreendidos na operação policial que resultou na prisão em flagrante do também irlandês Kevin James Mallon em um hotel na Barra da Tijuca.

Entidade membro da chamada “família olímpica”, o Comitê Olímpico da Irlanda tem direito a uma cota de ingressos de cada edição dos Jogos Olímpicos. Esses ingressos podem ser distribuídos a convidados ou vendidos por companhias cadastradas para o serviço. Na Rio-2016, entretanto, não foi isso que aconteceu.

Entradas reservadas ao comitê irlandês foram parar nas mãos da THG Sports, empresa que não está autorizada a comercializar entradas olímpicas e da qual Mallon é um dos diretores. A THG, aliás, foi já investigada pela polícia do Rio por envolvimento na máfia dos ingressos da Copa do Mundo de 2014. Durante o Mundial da Fifa, o diretor-geral da companhia, James Sinton, chegou a ser preso vendendo ingressos do torneio a preços acima do mercado – o ato configura crime de cambismo.

Apesar disso tudo, de acordo com investigações policiais, a THG voltou a vender ingressos ilegalmente para megaeventos esportivos realizados no Brasil. Segundo o delegado Ricardo Barbosa, que integra a Nage (Núcleo de Apoio aos Grandes Eventos) da Polícia Civil, a empresa faz parte de uma quadrilha bem articulada que atua no país em busca de grandes lucros com o comércio irregular de bilhetes.

Barbosa afirmou nesta segunda-feira (8) que a THG obtinha ingressos de diversas fontes para revendê-los. Como ingressos reservados ao Comitê Olímpico da Irlanda foram apreendidos com o diretor da companhia preso, a polícia não descarta a hipótese de esses bilhetes terem sido desviados da entidade para abastecer a quadrilha de cambistas.

De acordo com a polícia, 813 ingressos foram apreendidos no quarto em que Mallon estava hospedado no Rio. Boa parte deles foi apresentado à imprensa na Cidade da Polícia, no Rio de Janeiro. Quase todos eram nominais ao Comitê Olímpico Irlandês ou simplesmente à Irlanda.

Entre os bilhetes apreendidos, estavam tíquetes para a cerimônia de abertura da Olimpíada. A polícia informou que esses ingressos, que oficialmente custam R$ 1.400, estavam sendo vendidos por US$ 8 mil, ou seja, mais de R$ 24 mil.

TASSO MARCELO/AFP PHOTO
Ingresso da cerimônia de abertura é nominal a Comitê Olímpico Irlandês

Procurado pelo UOL Esporte, o comitê irlandês informou que a THG já foi revendedora oficial de ingressos reservados à entidade nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, e nos Jogos Olímpicos de Inverno de Sochi, em 2014. Na Olimpíada de 2016, entretanto, o serviço é prestado pela companhia Pro10, que está credenciada pelo Comitê Organizado da Rio-2016 para isso.

O Comitê Irlandês informou em nota que soube da prisão de Mallon no Rio. Por conta disso, abriu uma “investigação imediata” para apurar como os bilhetes reservados à entidade estão em posse do executivo preso. O órgão ainda declarou que segue os regulamente do COI (Comitê Olímpico Internacional) para venda de ingressos e terá “tolerância zero” caso malfeitos sejam constatados.

O UOL Esporte tentou entrar em contato com a THG. Ninguém foi encontrado. A reportagem também não conseguiu contato com o advogado de Mellon, que está preso preventivamente no presídio de Bangu.

Questionado sobre os ingressos irlandeses, o COI ainda não respondeu à reportagem. O Comitê Rio-2016 informou que não vai comentar as investigações da polícia, mas disse que colabora com ação.

Máfia do ingresso da Olimpíada

De acordo com a Polícia Civil, o esquema internacional de venda de ingressos da Olimpíada é maior do que o descoberto na Copa do Mundo de 2014. A quadrilha, que ainda não teve a identidade de todos os seus membros divulgada, esperava lucrar até R$ 10 milhões com o cambismo na Olimpíada.

Nessa quadrilha, a THG teria papel central. A empresa usava "artifícios para ludibriar as vítimas" e passar uma falsa imagem de credibilidade. Além de utilizar a logomarca dos Jogos Olímpicos de Londres no seu site oficial, ela oferecia os ingressos junto com pacote de serviços que incluam coquetéis em hotéis do Rio e até transporte aos eventos olímpicos.

Foi em um evento como esse que Kevin Mallon foi preso. Ele estava recepcionando torcedores que haviam comprado entradas para a cerimônia de abertura com a THG. Esses torcedores confirmaram à polícia que adquiriram os ingressos por um preço acima do praticado pelo Comitê Rio-2016.