Olimpíadas 2016

Ameaça terrorista na Rio-2016: quem são os chamados "lobos solitários"?

Nilson Soares/Futura Press/Estadão Conteúdo
Militares das Forças Armadas patrulham áreas estratégicas como o estádio do Maracanã, na zona norte carioca, palco da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de 2016 imagem: Nilson Soares/Futura Press/Estadão Conteúdo

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

A propaganda fundamentalista, em especial na internet, e os efeitos dos atentados que ocorreram nos últimos anos em países como França, Bélgica e Turquia colocaram à luz dos fatos, segundo autoridades brasileiras, uma grande ameaça à segurança da Olimpíada de 2016: o terrorismo.

Pela primeira vez, o Rio será sede dos Jogos. Como nunca antes na história da cidade, a chance de que ocorra um ataque dessa natureza --promovido ou não pelos chamados "lobos solitários"-- virou tema do bate-papo cotidiano de cariocas e turistas. Nas ruas, nos bares, nos elevadores, no almoço de família... Há os que acreditam e os que duvidam da ideia de que o país poderia ser vítima de atentados.

O professor André Luís Woloszyn, especialista em contraterrorismo e analista de assuntos estratégicos, diplomado pela Escola Superior de Guerra, afirma que "o grau de risco vai de médio a alto, e não se pode descartar hipótese alguma". Ele ressalta, contudo, que o Brasil está "tão vulnerável quanto qualquer outra nação".

"Essa ameaça tão comentada vem dos lobos solitários, que são indivíduos autóctones e que se inserem facilmente em qualquer paisagem urbana. E esse cenário não se apresenta apenas no Brasil."
André Luís Woloszyn

Rio tem clima de "guerra ao terror" na véspera da abertura dos Jogos

Mas quem são os lobos solitários?

São pessoas que agem individualmente inspirados em grupos radicais, mas sem necessariamente estar a serviço deles. Desde 2015, quando o Estado Islâmico promoveu um ataque sangrento em Paris, o governo brasileiro já demonstrava preocupação com esses personagens. O então ministro da Justiça José Eduardo Cardozo afirmou que, embora "incomum na literatura brasileira", os órgãos de inteligência do país estavam atentos ao assunto.

À época, reportagem da revista "Época" mostrou que a Polícia Federal havia desarticulado, em São Paulo, uma "rede de apoiadores" do Estado Islâmico. Os investigados são suspeitos de movimentar ilegalmente mais de R$ 50 milhões a fim de formar uma célula de apoio à organização terrorista.

Em julho deste ano, a duas semanas da cerimônia de abertura da Rio-2016, um grupo de mais de dez pessoas foi preso pela PF sob acusação de articular atentados terroristas durante os Jogos. Os detidos fizeram juramento ao EI e formavam célula amadora, afirmou o atual ministro da Justiça, Alexandre de Moraes.

O medo fez com que o Brasil buscasse cooperação do FBI, da Interpol, da polícia francesa e de outras instituições internacionais. Simulados e treinamentos foram realizados na cidade olímpica - em um deles, dois caças da Marinha colidiram no ar -, e homens fortemente armados passaram a patrulhar pontos turísticos e áreas de competições esportivas. Desde abril, agentes antibombas foram mobilizados para mais de cinco casos de pacotes suspeitos.

Por outro lado, os canais digitais do Estado Islâmico continuam tentando impulsionar a ameaça terrorista em solo brasileiro. Há pouco tempo, os terroristas começaram a traduzir suas propagandas para o português. No mês passado, um canal intitulado "Inspirem os fiéis" no Telegram, um aplicativo de telefone criptografado, aconselhou que "os lobos solitários de qualquer lugar do mundo podem ir para o Brasil agora".

"Podemos dizer que, com a Olimpíada, o Estado Islâmico descobriu o Brasil. (...) Eles [lobos solitários] já estão no país. Temos indícios fortes, um deles é o site em português direcionado ao recrutamento de adeptos brasileiros e propagação da ideologia. Isso é inédito na nossa história. Além disso, a própria inteligência brasileira já identificou uma centena de pessoas altamente radicalizadas. É uma realidade", afirmou Woloszyn.

"A tendência é que, se a gente não começar a trabalhar e investir na área de inteligência, esses radicais vão crescer. Uma hora vai acontecer um atentado terrorista no país, mas a questão é a gente saber quando, onde e como. Temos que nos antecipar", completou o especialista.

Para Edézio Ramos, professor de Direito Penal e Criminal da Universidade Mackenzie, o interesse de grupos como o Estado Islâmico está diretamente associado à oportunidade de ganhar ainda mais visibilidade. "O mundo agora está olhando para o Rio e para o Brasil, e a gente sabe que essas organizações gostam e precisam de holofotes. É dessa forma que elas conseguem cooptar mais adeptos. Por essa razão, o risco existe, sim. É um fato", declarou.

Solitários e invisíveis

Se, por um lado, o Estado Islâmico tem interesse em garantir mais visibilidade internacional, o perfil do lobo solitário sugere justamente o contrário: "Ele busca sempre passar despercebido", comentou Ramos.

"É difícil de identificar porque os lobos solitários podem ser qualquer pessoa. Aparentemente, pode ser aquele cidadão comum que vai e volta para casa todos os dias. Em geral, são indivíduos que apresentam algum tipo de problema na vida pessoal, tornando-se suscetíveis a internalizar uma ideologia extremista. É difícil neutralizar esse tipo de ameaça, a não ser que você já esteja monitorando um comportamento específico dentro de um contexto", explicou Woloszyn.

O especialista disse ainda que tais personagens agem praticamente por "instinto de oportunidade" e com "isolamento operacional". Woloszyn ressalta, porém, que a construção de um "biotipo terrorista" segue padrões flexíveis, que podem variar de acordo com os aspectos culturais. "Em geral, podemos dizer que são pessoas em busca de algum tipo de autoafirmação", finalizou.

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