! Ela levou 4 tiros em massacre e é contra os Jogos. Mas vai carregar a tocha - 04/08/2016 - UOL Olimpíadas

Olimpíadas 2016

Ela levou 4 tiros em massacre e é contra os Jogos. Mas vai carregar a tocha

Luiza Oliveira

Do UOL, no Rio de Janeiro

Thayane Tavares, 19, carregará para sempre a dor de uma tragédia. Uma das sobreviventes do massacre de Realengo, a jovem viu sua vida mudar há cinco anos, quando um atirador invadiu a escola onde estudava e abriu fogo. Ela levou quatro tiros e acabou paraplégica. Quer dizer, acabou não. Ao contrário. A cadeira de rodas entrou na sua rotina, mas não a impediu de seguir em frente e fazer sua voz ser ouvida. É o que ocorrerá nesta quinta-feira, quando Thayane, que é contra a realização das Olimpíadas no Brasil, irá conduzir a tocha olímpica pelo bairro onde viveu os piores momentos de sua vida. Ela tem um objetivo claro com esse gesto: protestar contra a violência.

Desde aquele 7 de abril, quando Wellington Menezes de Oliveira, o atirador de Realengo, invadiu a escola Tasso da Silveira e assassinou 12 crianças, a jovem sente todos os dias o dano permanente que a falta de segurança pode causar. Por isso, ela quer gritar pelo seu ideal quando carregar o símbolo maior dos Jogos Olímpicos e pedir mais segurança nas escolas.

“É importante eu carregar a tocha porque eu fui vítima da violência no Brasil. Quero representar a escola onde eu estudei, as crianças que morreram e também representar a falta de segurança que está aí. O que aconteceu é real e ninguém está livre disso”, afirma Thayane, que explica por que é contra a cidade receber os Jogos neste momento: “A cidade está muito despreparada para receber qualquer tipo de festividade, principalmente Olimpíadas. A questão da saúde, da segurança. A Baía de Guanabara, a Lagoa, está tudo despreparado. Eu faço canoagem, cansei de remar por cima dos peixes. Já vi peixe morto caindo na minha canoa. É nota zero. A cidade está em estado de calamidade”.

Rodrigo Ferreira/UOL
imagem: Rodrigo Ferreira/UOL

Sensação de terror

São os pedidos por mais segurança nas escolas e por um ensino de mais qualidade que unem tanto os sobreviventes do massacre quanto as mães que perderam seus filhos. Adriana Silveira e Joseane Bispo perderam suas filhas Luiza e Milena, respectivamente, na tragédia. Com a proposta de apoio mútuo, criaram a associação Anjos de Realengo.

Mas, mesmo cinco anos depois, elas continuam atormentadas pelo medo. Prova disso é que as supostas ameaças de ataque por seguidores do Estado Islâmico ao Rio 2016 as fazem temer pelo pior - essas mães já se considerarem vítimas de terrorismo.

Joseane proibiu as filhas Helena, 17, e Tainá, 20, de irem a festas durante os Jogos Olímpicos. “Se quiserem sair, não vou deixar. Já falei que não adianta pedir. A gente fica com medo ainda mais quem já passou por isso. O que aconteceu naquele colégio foi terrorismo, foram crianças inocentes morrendo sem saber o que estava acontecendo, ali foi terrorismo. Um fato único na história do nosso país. E eu tenho muito medo”.

Adriana vai além e suspeita até de ligações do atirador da escola com o terrorismo. “Quando se fala em terrorismo, o que aconteceu com nossos filhos foi um terrorismo. Vi uma entrevista da irmã dele dizendo que ele queria explodir o Cristo Redentor. O alvo dele era o Cristo Redentor, mas não tinha condições e fez isso na escola. Esse contato já existia por aqui, não com a proporção do que estamos vivenciando hoje. É uma situação muito delicada e séria que o nosso país está vivendo, o Rio de Janeiro, eu fico muito preocupada sim”, disse.

Símbolo de superação

Thayane também servirá de exemplo para outras bandeiras. Ela é considerada um símbolo de superação e não gosta de lamentar o ocorrido. Sabe que é preciso tocar a vida e seguir em frente. Não à toa, ela chama a atenção pela independência e por sempre estar com sorriso no rosto. Hoje, já mora sozinha, cursa a Faculdade de Direito e sonha ser delegada.

E essa maturidade foi atingida por meio do esporte. Foi a canoagem que a fez expurgar os monstros e se sentir livre e completa novamente. Inspirada no paratleta Fernando Fernandes, ela pensou até em competir.

"A canoagem me devolve a sensibilidade dos meus movimentos. Ali não tem cadeira, não tem nada. Todo mundo é igual. Esse é o ponto. Também me ajuda a fortalecer o tronco, as pernas. E quando vi a possibilidade de encontrar o que achei que tivesse perdido, me libertou da depressão”, afirma.

Topo