Vizinhos falaram que Gisa viraria 'machona' por jogar futsal
Felipe PereiraDo UOL, em São Paulo
Europa, Copa do Mundo, fama e fortuna são os pensamentos que veem à cabeça quando um garoto muda de cidade para jogar nas categorias de base de um time. Mas com Gislaine Costa, 17 anos, e a irmã gêmea a reação foi bem diferente. As pessoas questionavam a mãe, porque mulher que joga futebol vira “machona”.
“Chegavam para minha mãe e falavam que elas vão para lá e vão começar a gostar de mulher”.
(Esta reportagem faz parte do Especial #QueroTreinarEmPaz. Quando decide praticar esporte quase toda mulher enfrenta uma série de dificuldades que não deveriam existir. Dificuldades que homens não enfrentam. Se você, só porque é menina, já teve problema para praticar esporte, conte sua história nas redes sociais usando a hashtag #QueroTreinarEmPaz)
A tão criticada mudança era de Bom Retiro, município da serra catarinense com 9 mil habitantes, para Lages - polo regional de cidades que só aparecem no noticiário nacional em dias de frio extremo. Gisa, como é conhecida, tinha 14 anos passaria a treinar futsal e morar num alojamento com atletas de todas as idades, incluindo adultas.
As fofocas afirmavam que além de virarem gays, as gêmeas aprenderiam tudo que há de errado. A mãe conversou com as duas e pediu para ser avisada caso ocorresse qualquer problema. Terminou o assunto dizendo que confiava na educação dada às filhas e deixou que ganhassem o mundo.
Nem todos na família pensavam assim. A avó Anadir, a quem Gisa era muito ligada, tinha severas restrições em relação a jogar bola.
“Ela falava que futebol não era para menina. A gente tinha que ficar em casa e ajudar a mãe. Falava que tinha que usar saltinho, não podia usar tênis”.
Gysa seguiu o sonho e está em Lages desde 2014 defendendo o time de futsal das Leoas da Serra. Ela conta que enquanto jogava em Bom Retiro, na Escolinha do Tio Zé, não havia comentário. A maldade começou quando foi anunciada a mudança.
O preconceito não aconteceu somente em Bom Retiro. Na época o Leoas da Serra se chamava Inter de Lages, o time de futebol de campo da cidade. Na escola, no supermercado e nas ruas a passagem dela era seguida frase “lá vem a machona do Inter”.
A cultura do fiu-fiu
Ser tratada como lésbica não é a única manifestação de preconceito em relação às atletas da base do Leoas da Serra. Passar pelas ruas de bermuda, camisa, meião e tênis faz muitos homens secarem as garotas. Gisa e as companheiras ouvem muitas cantadas grosseiras.
“Na rua quando tá passando com roupa do time começam a fazer essas ‘brincadeira’. Nem dá para dar muita bola.”
O que surpreende é a idade dos homens que fazem as cantadas. Eles são de todas as faixas etárias revela a jogadora que nem completou 18 anos. Gisa não pensa em parar, porque gosta bastante de jogar futsal.
Mas nem o sucesso em quadra é garantia de tranquilidade financeira no futuro. Por este motivo, entrou para faculdade de Educação Física.