Cesar Cielo tem uma missão antes da Olimpíada. Dono de três medalhas olímpicas (ouro nos 50m livre e bronze nos 100m livre em Pequim-2008, e bronze nos 50m livre de Londres-2012), o nadador de 29 anos teve um ano conturbado em 2015 e não obteve ainda o índice para a Rio-2016. A última chance será o Troféu Maria Lenk, de 15 a 20 de abril, no Estádio Aquático Olímpico, e ele optou por uma mudança na preparação: deixou a comissão técnica que havia montado no Brasil e foi treinar nos Estados Unidos com Scott Goodrich, com quem já tinha trabalhado de 2013 a 2014.

Para o novo treinador, não há motivo para preocupação. Goodrich, 29, é apenas seis meses mais velho e chegou a ser companheiro de equipe de Cielo. Viu de perto o potencial do brasileiro, que viveu seu último auge técnico no período em que trabalhou com o norte-americano – o nadador foi campeão mundial dos 50m livre e dos 50m borboleta em Barcelona-2013.

“Por que não acreditar nele?”, questionou Goodrich em entrevista exclusiva ao UOL Esporte. Curiosamente, o treinador usou especificamente a pressão como uma das razões para confiar no nadador: “Cesar é um dos melhores competidores nessa situação”. Confira abaixo os principais assuntos da conversa com Scott Goodrich:

Novo técnico conhece Cielo há dez anos e é apenas seis meses mais velho

Cielo e Goodrich foram companheiros de treino (como atletas) na equipe da Universidade de Auburn entre 2005 e 2008. Depois, trabalham juntos entre 2013 e 2014 (já com o americano como o treinador). A relação profissional foi encerrada sem traumas, e os dois continuaram amigos. Pesa para isso a proximidade de idade – Goodrich, 29, é apenas seis meses mais velho do que o nadador.

“Nos conhecemos há quase dez anos. Muito mudou desde então, e nós dois crescemos e evoluímos. Cesar continua a aprender e melhorar a cada ano que passa. Em meio às coisas boas e ruins, ele sempre aprende algo novo para ajudá-lo na próxima temporada. Você não fica no topo como ele se não aprender e se adaptar para ser cada vez melhor”, afirmou o técnico.

Até por conta disso, o processo de reaproximação foi natural quando Cielo optou pela mudança drástica de estratégia em sua preparação para a Rio-2016.

“A conversa não teve nada de especial. Sempre falávamos, mesmo quando não estávamos trabalhando juntos. Eu me preocupo muito com sua carreira na natação e sempre o quero ver tendo sucesso, não apenas como um treinador, mas também como um fã e um amigo. Penso que no passado nossa amizade ajudou muito nesta relação nadador/treinador, permitindo que desempenhássemos um trabalho muito bom. Nós temos uma boa relação dentro e fora da piscina e trabalhamos muito bem no passado. Ele sabe o que esperar quando estamos treinando juntos”, analisou Goodrich.

'Os rivais devem ser preocupar com Cielo'

Ainda que Cielo não tenha conseguido render bem em 2015 e esteja sem índice para os Jogos, Goodrich acredita que seu pupilo tem condições de chegar à Rio-2016 e brigar por sua quarta medalha olímpica – tem um ouro e um bronze nos 50m livre e um bronze nos 100m livre.

Se conseguir subir ao pódio no Rio, Cielo, 29, será apenas o segundo nadador na história olímpica a medalhar nos 50m livre com essa idade. O único até hoje foi Gary Hall Jr, ouro nos Jogos de Atenas-2004.

“A natação mudou muito ao longo dos últimos 12 anos, e os nadadores se tornaram profissionais de fato. Nesta Olimpíada, veremos atletas muito mais velhos do que no passado. Penso que Cesar é mais do que capaz de ganhar uma medalha – ele é um grande velocista. Mas não será fácil. Existem vários grandes competidores”, analisou Goodrich.

Entre esses grandes competidores, Goodrich aponta o francês Florent Manudou – atual campeão olímpico e mundial dos 50m livre – como o rival a ser batido. O treinador, porém, acredita que Cielo é acompanhado com atenção por seus principais rivais.

“Temos várias competições importantes neste ano, mas sinto que o Cesar está no radar de todo o mundo. Seus rivais sabem que, se ele está na competição, é um cara com o qual precisam se preocupar. Eles [adversários] sabem que ele é capaz de vencer”, avaliou.

A confiança em uma medalha é apenas parte do discurso de Goodrich. O treinador divide suas palavras entre o otimismo e o pensamento de curto prazo. Cielo não está garantido nos Jogos, afinal.

“Neste momento, o principal foco do Cesar está em abril, no Maria Lenk. Ainda temos um tempo considerável antes do Rio, e a Olimpíada definitivamente está em nossas mentes, mas temos de nos focar nas competições que vêm antes. Pensaremos no Rio com exclusividade apenas a partir de abril”, disse.

'Cielo é um dos melhores para aguentar pressão'

Que Cielo está pressionado não é segredo. Tampouco é segredo que ele terá até quatro chances de assegurar a vaga olímpica (eliminatórias e finais dos 50m livre e 100m livre no Troféu Maria Lenk). Isso não tira o sono de Goodrich.

“O Cesar é um dos melhores competidores na situação de grande pressão. Isso é algo intrínseco a ele e é o que faz um dos melhores nadadores do mundo. Ele tem a habilidade de ter a sua melhor performance nas maiores competições. Tirando o ano passado, quando ele não conseguiu nenhuma medalha, olhe o que ele fez nos outros oito anos. Por que não acreditar nele?”, questionou o treinador.

A avaliação da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA) é que Cielo precisa readquirir a confiança perdida após um 2015 desastroso. Para Goodrich, esse processo depende fundamentalmente dos resultados.

“A confiança vem de nadar rápido, e nadar rápido vem de treinar bem. Meu trabalho é fazer com que o Cesar treine bem para nadar rápido. Confiança é apenas uma consequência de nadar rápido. Cesar, mais do que ninguém, sabe do que é capaz. Ele não estaria fazendo esse sacrifício [de ficar longe da esposa e do filho] se não tivesse certeza de que ainda pode alcançar o seu melhor desempenho”, disse.

Uma competição por mês até o Maria Lenk

Para chegar bem ao Maria Lenk, Cielo tem passado entre 18 e 20 horas por semana na piscina e tem feito três sessões semanais de academia, com foco na musculação. Em termos competitivos, a ideia de Goodrich é inscrever o brasileiro no maior número possível de provas até abril. Entretanto, esse calendário ainda não está definido.

“É muito importante para o Cesar participar de mais e mais provas antes de grandes competições. Nossa meta é que ele dispute uma competição por mês. Talvez isso não seja possível pela maneira que as competições são escalonadas, mas esse seguirá sendo nosso objetivo”, afirmou.

“A prioridade estará nos 50m livre e nos 100m livre. Obviamente, Cesar colocará os 50m livre como o foco principal, mas os 100m serão muito importantes para que ele possa nadar os revezamentos [na Olimpíada]”, completou Goodrich.