Campeões mundiais da canoagem recusam competir em evento-teste da Rio-2016
Antoine Morel e Guilherme CostaDo UOL, no Rio de Janeiro
A equipe brasileira de canoa se recusou a participar do evento-teste para a Olimpíada de 2016 nesta sexta-feira. Os atletas alegaram problemas com a Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa) para não competirem no torneio que acontece na Lagoa Rodrigo de Freitas, mesmo palco da disputa olímpica.
Os atletas insatisfeitos são Isaquias Queiroz - que recentemente ganhou uma medalha de ouro e uma de bronze no Mundial de Milão (ITA) -, Nivalter Santos medalhista nos Jogos Pan-Americanos de Toronto -, Erlon Silva - campeão mundial do C2 1.000m ao lado de Isaquias - e Ronilson Oliveira.
As queixas dos atletas têm dois motivos diferentes e expõem uma crise institucional. A principal é a falta pagamento de salários por parte do BNDES (patrocinador da confederação) e a segunda são as condições de hospedagem na Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx), onde ficaram ao longo desta semana no Rio de Janeiro.
O problema salarial
De acordo com os canoístas, eles estão sem receber salários do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento) há oito meses. A remuneração chega aos atletas por intermédio da Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa) e eles já haviam informado a entidade que não competiriam no Rio se os valores não fossem quitados. O COB (Comitê Olímpico do Brasil) teve de arcar com os vencimentos dos competidores neste tempo.
“A gente não está passando fome e não está sem dinheiro. A gente está aqui para protestar contra as coisas erradas e a falta de respeito da confederação. Isso não vem de agora. Nós temos campeões mundiais, estamos fazendo um trabalho bonito mesmo sem apoio deles. Com o COB (Comitê Olímpico do Brasil) e as leis de incentivo está tudo certo", disse Nivalter Santos, atleta da canoagem.
Principal nome do esporte do Brasil na atualidade, Isaquias Queiroz também falou sobre o problema. O campeão do mundo pediu para não usar o uniforme da seleção em etapas da Copa do Mundo, para não exibir o logo do BNDES.
"Não é por dinheiro, o problema é que estamos competindo com uma marca que não está pagando. A gente não pode exibir patrocinadores pessoais, mas eles também não pagam a gente pelo patrocínio da confederação. Assim fica difícil. Não tem respeito, disse.
Logo após os atletas fazerem o protesto e se recusarem a competir, o presidente da CBCa João Tomasini Schwertner negou que os atletas estejam sem apoio da entidade e explicou que um problema burocrático atrasou a liberação da verba proveniente do BNDES.
"Eles (atletas) não estão desassistidos. R$ 88 mil por mês (valor pago a toda a equipe) não é coisa de desassistido. O BNDES paga por projetos desde que começou a nos patrocinar, em 2012. O projeto Lagoa Santa (centro de treinamento dos atletas da canoagem) precisou de um documento ambiental que demorou 105 dias para chegar, e por isso o pagamento não foi feito. Intercedemos em novembro e procuramos o COB (Comitê Olímpico do Brasil) para que os atletas não ficassem desassistidos", disse.
"O dinheiro (do BNDES) já está na conta e vale a partir de setembro. O pagamento vai ser feito dez dias a partir da assinatura do contrato que está na mão dos atletas. O COB não paga mais a partir de setembro", garantiu o dirigente.
A versão do dirigente foi ratificada pelo banco por meio de uma nota oficial:
"Não há, ao contrário do que alegaram alguns atletas da equipe brasileira de Canoagem hoje, no Rio de Janeiro, nenhum atraso no pagamento de suas remunerações. Acordo firmado entre a Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa) e o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) permitiu que não houvesse nenhuma interrupção do programa de treinamentos destes atletas — nem quanto ao pagamento de bolsas-auxílio, que está absolutamente em dia, nem quanto às condições de treinamento — enquanto um projeto específico para os atletas de canoa estava em tramitação no Ministério do Esporte e no BNDES. Neste momento, o projeto está aprovado, contratado, e os recursos disponíveis para aplicação nas despesas previstas, inclusive o pagamento de bolsas. Os atletas já têm em mãos o contrato de que precisam para firmar o recebimento de auxílio pelos próximos doze meses."
Sobre a ameaça de Isaquias de não competir em etapas da Copa do Mundo sem a logomarca do BNDES no uniforme, Schwertner disse que se mostrou irredutível.
"Você consegue imaginar o Giba com um uniforme do Bradesco em um jogo de vôlei? E o Neymar, por acaso ele pode usar uniforme com patrocinador pessoal? O que temos aqui é a seleção brasileira", disse.
Falta de conforto nas acomodações
De acordo com Isaquias, as condições de alojamento na Escola de Educação Física do Exército deixaram a desejar.
"Eles botaram a gente para dormir na escola do exército e botaram nosso treinador (Jesús Morlán) num beliche. Quero ver se o presidente da confederação está dormindo em beliche”, afirmou.
O presidente da confederação não digeriu bem esta crítica.
"Os atletas estão reclamando de ficar na escola do exército? E onde ficaram os atletas da vela? Isso responde sua pergunta", disse.
Apesar da recusa de os canoístas de competirem, uma punição imediata foi descartada por Schwertner.
"Não vamos punir. A CBCa não tem prerrogativa para punir ninguém. Quem pode punir os atletas da canoagem é o TJD (Tribunal de Justiça Desportiva) da Canoagem", afirmou.
Por este motivo, o Ministério credita um voto de confiança e espera que a situação volte à normalidade o mais breve possível", disse a pasta em nota oficial.