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Ele corria atrás de pipas no morro. Hoje, é esperança do atletismo

Osvaldo F/Contrapé

Bruno Doro

Do UOL, em São Paulo

A prova dos 800m anda em baixa, mas tem uma história rica por aqui. Dos eventos de pista do atletismo, é a única em que o Brasil tem uma medalha de ouro, com Joaquim Cruz em 1984. Além dele Agberto Guimarães e Zequinha Barbosa também já estiveram entre os melhores do mundo. Até hoje os três aparecem entre os tempos mais rápidos da história.

O próximo dessa lista pode ser um garoto de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, que só aceitou virar corredor quando ofereceram R$ 30 para que treinasse todos os dias. “Eu adorava pipas. Corria atrás delas como um louco, todo dia. Um amigo viu e convidou para ir até a Vila Olímpica da Mangueira. Eu fui. No segundo dia, a treinadora me convidou para treinar todos os dias. Eu estudava de manhã. E à tarde era o melhor horário para soltar pipa. Não queria ficar correndo na pista enquanto todo mundo estava soltando pipa”.

Thiago André

  • Osvaldo F/Contrapé

    Quando ofereceram R$ 30 para treinar, eu pensei: dá para comprar pipa e linha à vontade

    Thiago André, sobre como começou a treinar atletismo na Vila Olímpica da Mangueira
Quando viu o dinheiro, o destino era certo: “Dava para comprar a pipa e as linhas. Não pensei duas vezes”. Anos depois, aqueles R$ 30 já renderam muito. No Mundial Júnior de atletismo de Eugene, nos EUA, no ano passado, foi o quarto colocado nos 800m e nos 1500m. À frente só de africanos. No Troféu Brasil deste ano, disputado em São Bernardo há duas semanas, venceu as duas provas, com folga.

“Hoje, o que eu mais gosto de fazer é correr”, admite. O que o fez chegar a esse estado de espírito, porém, não foram exatamente as vitórias. “Eu decidi que iria apostar nessa carreira quando viajei pela primeira vez de avião, para uma competição em Porto Alegre. Lembro que minha mãe ficou toda contente e contou para o morro todo que o filho dela iria viajar de avião. Na competição, conheci muita gente. E decidi que iria correr para viajar. Para conhecer gente diferente”.

Até hoje ele faz isso. Uma dessas pessoas diferentes que ele conheceu foi seu técnico atual, Adauto Domingues. “Eu queria vir para São Paulo. No Rio, não tinha estrutura. Pegava trem para ir treinar, duas horas de Belford Roxo até a Mangueira. Então, em um Troféu Brasil, fui atrás do Adauto. Disse que queria ser treinado por ele. Acho que ele não me queria muito. Voltei para o Rio, liguei todos os dias, por semanas. Até que ele aceitou. Acho que fez isso porque estava cansado de falar comigo por telefone”, conta.

Osvaldo F/Contrapé
imagem: Osvaldo F/Contrapé
Adauto ri da explicação do garoto. Para ele, a versão é outra: “Tirar um garoto de 18 anos da casa dele nunca é fácil. Você precisa saber onde ele vai morar, como ele vai comer, onde vai estudar. Eu estava procurando ajeitar tudo. Mas acabou não dando tempo. Quando o Thiago chegou, ficou em um alojamento que tinha na pista de São Caetano, que nem existe mais. Jogou um colchão no chão e ficou, até encontrarmos uma casa”.

Sorte do Brasil que os dois, Adauto e Thiago, acabaram juntos. O potencial do garoto pode render frutos. “Ele é acima da média. Não digo para 2016, que está em cima. Não dá para dar experiência e fazer com que ele ganhe tudo o que precisa de força em um ano. Mas acho que ele pode chegar aos índices e ir para uma final olímpica já no ano que vem. E andar próximo dos africanos”.

Quem viu Thiago correr não duvida que ele seja capaz. Uma pena que as finais do atletismo no Rio 2016 serão noturnas. Nenhuma pipa estará no céu carioca enquanto o caçador de pipas estiver em busca de um lugar no pódio...

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