'Homem forte' da Rio-2016 admite: "talvez entreguemos um pouquinho menos"

Vinicius Konchinski
Do UOL, no Rio de Janeiro
Carol Guedes/Folha Imagem
Ricardo Leyser é secretário-executivo do Ministério do Esporte

Ricardo Leyser trabalha no Ministério do Esporte desde 2003 e, neste ano, assumiu o cargo de secretário-executivo da pasta. Com isso, passou a ser considerado o “vice-ministro”, representando o titular George Hilton em eventos públicos, e tomando a frente do projeto esportivo mais importante do governo federal atualmente: a Olimpíada.

Hoje, Leyser acompanha toda a preparação do país e dos atletas brasileiros para os Jogos Olímpicos de 2016, que começam daqui a 527 dias. Se diz confiante de que o Rio de Janeiro e o Brasil estarão preparados para o maior evento esportivo do mundo. Mesmo assim, admite a possibilidade de que nem tudo que foi prometido ao COI (Comitê Olímpico Internacional) esteja pronto quando a Olimpíada começar.

"Algumas coisas, vai se entregar muito mais [do que o que foi prometido]. Outras, talvez um pouquinho menos”, disse ele, em entrevista concedida ao UOL Esporte na terça-feira.

Leyser conversou com a reportagem em um hotel, em Copacabana, no Rio de Janeiro. É lá que membros do COI estão reunidos desde segunda-feira avaliando os preparativos para a Olimpíada do Rio de Janeiro. Leyser participa dessas reuniões.

Confira abaixo os principais trechos de sua entrevista ao UOL:

UOL: O que o COI achou dos preparativos para a Olimpíada de 2016?
Ricardo Leyser:
Nesta visita, o progresso ficou evidente pra eles. Eles ficaram impressionados. Há um ano, estávamos começando a obra do Parque de Deodoro [segundo maior local de competição da Rio-2016] e o laboratório de controle de dopagem ainda era um problema. Hoje, as coisas se desenvolveram muito. Isso marcou uma avaliação positiva do COI. Estamos muito bem.

UOL: Há alguma obra cuja execução preocupe mais?
RL:
Você sempre tem questões pontuais sobre obras. Por exemplo, este período seco ajudou a acelerar a obra de pista de canoagem slalom em Deodoro. Ao mesmo tempo, a falta d'água prejudicou o desenvolvimento da grama do centro de hipismo. Essas questões você tem que administrar. Uma hora, uma coisa acelera e outra atrasa um pouco. Mas não há nenhuma obra que esteja fora de um cronograma viável para a realização dos os eventos testes. Para os Jogos Olímpicos, a tranquilidade é ainda maior.

UOL: O prefeito disse que o velódromo estava três semanas atrasado no final do ano passado.
RL:
Nem mesmo o velódromo é um problema. Há um problema com a situação financeira da construtora [a Tecnosolo, que é subsidiária de uma companhia em recuperação judicial]. O que temos que fazer é acompanhar.

UOL: Como está a relação do governo com o COI?
RL: Muito boa. O COI é muito técnico. As vezes, o que há é um choque de culturas que tem impactos na visão sobre o projeto olímpico do Brasil. No começo de 2014 [quando a preparação para a Olimpíada foi criticada], tínhamos certeza que estávamos no caminho certo. Eles só ganharam essa certeza em 2015. São aspectos culturais sobre como as coisas funcionam. O COI fica na Suíça. No Brasil, se contrói mais moradias por ano do que existe na Suíça inteira hoje. Fazemos mais saneamento básico todo ano do que já foi feito na Suíça até hoje. Em países menores, as coisas têm outro ritmo. Isso deixa as pessoas do COI incomodadas. Eles não sabem como fazemos para resolver as coisas. Possivelmente, só no que a gente avançou na despoluição da Baía de Guanabara desde o início da preparação do Brasil para a Olimpíada daria para tratar o esgoto de duas ou três Suíças inteiras. Eles não têm essa dimensão.

UOL: Falando da baía, como é para o COI ver que, por mais que muito seja feito, as metas olímpicas de limpeza do espaço não devem ser cumpridas? O próprio governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, já admitiu essa possibilidade.
RL: Os Jogos Olímpicos são um evento esportivo. Existem as condições mínimas para que se realize o evento esportivo. Hoje, já é possível fazer as competições esportivas na Baía de Guanabara. Agora, eu acho que a gente não deve jogar sobre um evento esportivo a responsabilidade de resolver todos os problemas históricos da sociedade. Em 2007, nós tínhamos 11% de tratamento do esgoto que era lançado na baía. Hoje, temos 51%. Vamos tentar chegar a 81%. Mas não se não chegar em 81%, chegar em 75%, isso já é um trabalho gigantesco. A Baía de Guanabara vai estar cinco, seis ou sete vezes melhor do que estava.

UOL: Uma série de compromissos públicos foram assumidos por causa da Olimpíada. Não é frustrante não cumpri-los?
RL: Não. Nenhum grande projeto é 100% bem sucedido. O que Brasil vai conseguir fazer não é diferente do que Pequim conseguiu. Pequim [sede da Olimpíada de 2008] tinha problemas ambientais. Eles não resolveram o problema da poluição atmosférica, mas melhoraram e deram um exemplo de esforço. No Brasil, em outros segmentos, como o do esporte, está sendo feito muito mais do que se prometeu. Quando você olha o projeto como a Olimpíada, é preciso olhar o todo. Algumas coisas, vai se entregar muito mais. Outras, talvez um pouquinho menos. Só não pode ser muito menos. Tudo tem que estar dentro de um patamar razoável.

UOL: Crise energética, falta d'água e aumento da violência no Rio são riscos para a Olimpíada de 2016?
RL: Não. Hoje, não há nada que aponte para isso. Mas tudo é acompanhado.

UOL: A Prefeitura, recentemente, fez um aditivo de R$ 15 milhões (8% do total) no contrato da obra do centro de tênis da Olimpíada. Outras obras terão aumento de preço?
RL: A intenção é que tenhamos o mínimo possível de aditivos de valor. No estágio de preparação que a gente está, se tivesse que haver mais aditivos, eles já teriam aparecido. E por mais que tenhamos algum aditivo, já tivemos uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) nas obras olímpicas. Nenhum indício de sobrepreço foi apontado.

UOL: O governo federal assumiu recentemente os custos da segurança, energia e equipamentos esportivos da Olimpíada. Isso, inicialmente, seria pago pelo Comitê Organizador da Rio-2016 com dinheiro de patrocínios. O governo pretende pagar mais coisas?
RL: Não. No dossiê de candidatura do Rio à sede da Olimpíada, a União prometeu investir até cerca de R$ 700 milhões no comitê [governo do Estado e prefeitura devem investir o mesmo valor]. Estamos bem perto disso. Temos cerca de R$ 100 milhões em equipamentos esportivos e cerca de R$ 600 milhões entre energia e segurança. Obviamente, queremos que tudo saia mais barato, mas temos evitado falar sobre esses valores porque tudo é muito preliminar.

UOL: A meta do Brasil de ser top 10 no quadro de medalhas da Olimpíada será atingida?
RL: É um desafio. Nós podemos atingir o top 10 e estamos no caminho certo. Porém, não é uma meta simples. Nós vamos descobrir só nos Jogos. Todos os dados anteriores mostram a possibilidade de chegarmos nisso. Temos que ter entre 25 e 27 medalhas olímpicas para estar lá. Os resultados mostram que é possível. Mas os Jogos Olímpicos são uma coisa única: tem pressão, tem torcida, tem os outros países. O que vale é o que acontecerá em 2016.

UOL: Como está o Ministério do Esporte, agora comandado por George Hilton (PRB)?
RL: O grande foco do ministro é a entrega dos Jogos Olímpicos. O ministro também quer que a motivação que temos hoje sirva para a democratização do acesso ao esporte de base e esporte educacional após a Olimpíada. A intenção é fazer com que tudo vire um movimento para que a gente traga o esporte de base e social o mesmo investimento que a gente tem no olímpico. A ideia é que o esporte ganhe uma política pública. Que estados e municípios também façam investimentos. Por isso, o ministro tem falado na criação de uma política nacional do esporte, com funções estabelecidas e um sistema montado.

UOL: Essa nova política para o esporte compreenderá um controle mais rígido dos investimentos feitos com dinheiro público nas confederações?
RL: Tudo deve ser ligado a um planejamento. Temos que saber onde queremos chegar com esse dinheiro que vamos investir. Hoje, o controle sobre as confederações já é cada vez maior. O recurso dos convênios do Ministério do Esporte já não passa nem pela conta da confederação. A entidade escolhe uma empresa para prestar um serviço e o ministério paga essa empresa. Há um maior acompanhamento e até parceria. As confederações vêem isso como positivo porque as ajuda. Força um planejamento.

UOL: O senhor sai do ministério após o fim da Olimpíada?
RL: Minha visão é encerrar o ciclo em 2016. Esse é o compromisso que tenho com o ministro. A gente fecha a tarefa que foi dada.

UOL: E o que você quer fazer depois?
RL: Primeiro, quero fazer os Jogos Olímpicos. Depois que der certo, vou tirar férias, deixar o celular na privada uns três meses e sumir (risos).