RJ manda atletas 'desalojados' treinarem em estádio em obras

Vinicius Konchinski
Do UOL, no Rio de Janeiro

Quase dois anos após o fechamento do Estádio de Atletismo Célio de Barros, o governo do Rio de Janeiro finalmente providenciou um espaço para que uma parte dos esportistas ‘desalojados’ pela reforma do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014 possa treinar. No início deste mês, o governador Luiz Fernando Pezão deu seu aval para um acordo entre o Estado e Botafogo para que até 80 atletas usem o Engenhão em suas práticas diárias. O problema é que o acordo não veio numa boa hora.

O Engenhão (Estádio Olímpico João Havelange) está interditado desde o ano passado para que possa passar por reparos em sua cobertura. A obra começou em julho de 2013 e só deve terminar no fim do ano. Por causa da reforma, máquinas e guindastes ocupam hoje a pista de atletismo principal do estádio, o que inviabiliza seu uso por atletas.

Resta para os esportistas, então, a pista externa do Engenhão. Contudo, não por muito tempo. O espaço está prestes a ser fechado já que será reformado para a Olimpíada de 2016, junto com a pista principal.

A Riourbe (Empresa Municipal de Urbanização) já lançou uma licitação para a troca completa do piso da pista interna e externa do Engenhão para os Jogos Olímpicos, além de outras obras adicionais no estádio necessárias para o evento. Segundo a própria empresa, a reforma olímpica começa em março de 2015 e termina em fevereiro de 2016.

“E aí? Onde os atletas vão treinar?”, questiona o secretário-geral da AACB (Associação dos Atletas e Amigos do Célio de Barros), Daniel Gonçalves, que também é preparador físico e fisiologista. “O governo esperou dois anos para arrumar um lugar para os esportistas treinarem. Quando arruma, põe os atletas num lugar prestes a ser fechado.”

Gonçalves é crítico do acordo do governo com o Botafogo para cessão do Engenhão para até 80 esportistas do Célio de Barros. Segundo ele, o número é bem menor do que o universo de atletas que treinavam no estádio anexo ao Maracanã. Gonçalves disse ainda que, no Engenhão, praticantes do atletismo estão em segundo plano e, por isso, não podem treinar tão bem quanto num estádio dedicado ao atletismo.

“O Engenhão está sob controle do Botafogo. É para o futebol do Botafogo. Lá, o atletismo está em segundo lugar, e é natural que seja assim”, explicou. “Se o time do Botafogo vai treinar de manhã, o atleta não pode usar a pista de manhã. Se o treino muda para a tarde, quem treinaria de tarde tem que esperar. Isso prejudica.”

O governo do Rio foi questionado sobre a transferência dos atletas do Célio de Barros para o Engenhão. Informou que a mudança atende a um pedido Farj (Federação de Atletismo do Rio de Janeiro). O número de atletas autorizado a treinar no estádio, inclusive, teria sido indicado pela federação.

Carlos Alberto Lancetta, presidente da Farj, confirma. Disse que entre 300 e 400 atletas que treinavam no Célio de Barros já foram transferidos para outros espaços do Rio. Ele ressaltou, porém, que nenhum desses locais é tão bom quanto o antigo estádio de atletismo do Maracanã. O Engenhão, por todos as suas restrições, é uma solução ainda mais paliativa. 

"O Engenhão não é o ideal. Sabemos que as pistas do estádio estão para fechar. Mas é alguma coisa", afirmou Lancetta. "Agora, o que queremos mesmo é a volta do Célio de Barros. Até lá, a gente tem que se adaptar."

Sobre a reforma do Célio de Barros, o governo declarou que o projeto está sob análise dos órgãos de licenciamento. Não informou quando a obra começa. Mesmo assim, declarou que ainda espera que ela esteja concluída antes do início da Olimpíada de 2016, conforme determina o contrato de concessão do complexo esportivo do Maracanã (leia mais abaixo).

Apesar da confiança do governo, pessoas ligadas a Maracanã S/A, responsável pela reforma, já informaram o UOL Esporte que a reforma do Célio de Barros só deve começar após os Jogos.

Pelo acordo fechado com o Botafogo, os atletas transferidos para o Engenhão podem treinar no estádio enquanto durarem as obras do Célio de Barros. O governo não informou, entretanto, o que acontecerá com os atletas quando a nova reforma do Engenhão começar.

Idas e vindas sobre o Célio de Barros
  • Fechamento
    Em janeiro de 2013, o governo do Estado do Rio de Janeiro fechou o Estádio de Atletismo Célio de Barros. O espaço, que fica exatamente ao lado do Maracanã, foi incorporado ao canteiro para as obras na arena da final da Copa do Mundo de 2014. Quando a reforma acabou, em junho, o Célio de Barros passou a ser usado como estacionamento do estádio de futebol.
  • Demolição
    Em junho de 2013, o governo e a Maracanã S/A assinaram o contrato que tornou privada a administração do Complexo do Maracanã. Neste contrato, estava previsto que a concessionária do estádio era obrigada a demolir o Célio de Barros e construir naquela área um estacionamento. Pelo contrato, a empresa também teria que construir um novo estádio de atletismo numa área próxima ao Maracanã.
  • Protestos
    A privatização da administração do Maracanã e a demolição do Célio de Barros foram temas de protestos que tomaram as ruas do Rio durante a Copa das Confederações, em junho de 2013. Atletas, dirigentes esportivos e movimentos sociais demandaram o cancelamento da concessão. O Ministério Público entrou na Justiça questionando a legalidade do contrato firmado entre governo e Maracanã S/A.
  • Reconstrução
    Em agosto de 2013, o governador Sergio Cabral anunciou que a demolição do Célio de Barros estava cancelada. Atendendo às reinvindicações de manifestantes e de atletas e dirigentes esportivos, Cabral disse que a concessão do Maracanã seria reestruturada. Ele, inclusive, abriu a possibilidade de a Maracanã S/A desistir do negócio. Desta forma, a administração do Maracanã voltaria a ser estatal.
  • Indefinição
    Ainda em agosto, a Maracanã S/A enviou um documento ao governo do Rio informando que gostaria manter o controle sobre o Maracanã apesar das mudanças no projeto da concessão anunciadas pelo então governador. Naquele momento, apesar da manifestação da Maracanã S/A, nem o governo nem a empresa sabiam quem faria e pagaria pela reconstrução do Célio de Barros, muito menos quando ela seria concluída.
  • Ajuda federal
    Em setembro, o governo do Rio de Janeiro pediu ao governo federal uma ajuda de R$ 10 milhões para que ele mesmo pudesse reconstruir o Célio de Barros. A solicitação foi feito por meio da Secretaria Estadual de Esporte e Lazer. O então secretário André Lazaroni afirmou na época que, com os recursos, o estádio de atletismo seria reaberto em seis meses, ou seja, em março de 2014.
  • Obra privada
    Em janeiro de 2014, reviravolta: o governo alterou o contrato assinado com a Maracanã S/A. Com a mudança, a empresa passou a ser a responsável pela reconstrução do Célio de Barros. Segundo o aditivo, a obra deveria ser concluída em 30 meses, ou seja, em julho de 2016, dias antes do início da Rio-2016. O início da obra, entretanto, dependeria de uma aprovação do projeto para a reforma do espaço.
  • Adiamento
    Oficialmente, o projeto de reconstrução do Célio de Barros está sob análise de órgãos de licenciamento. Por isso, a obra ainda não começou. Pessoas ligadas ao projeto, contudo, já foram informadas que a reforma deve começar só depois da Olimpíada para que o espaço possa servir como estacionamento para que for ao Maracanã na Rio-2016. Desde a Copa das Confederações, essa já é a função do estádio.
  • Só em 2018
    O filho de ex-governador Sergio Cabral, Marco Antônio Cabral, assumiu em janeiro a Secretaria Estadual de Esportes do Rio de Janeiro. Logo após sua posse, declarou ao UOL Esporte que o Célio de Barros só será reinaugurado no fim de 2018.