Moradores fazem plano para evitar remoção por Rio-2016 e ganham prêmio

Vinicius Konchinski

Do UOL, no Rio de Janeiro

Moradores da Vila Autódromo, no Rio de Janeiro, receberam no início do mês um prêmio internacional de urbanismo por causa do plano que eles mesmos elaboraram para evitar a extinção do bairro devido às obras para a Olimpíada de 2016. Em meio a 170 projetos concorrentes, jurados do Deutsche Bank Urban Age Award viram no chamado Plano Popular feito para a região por próprios seus habitantes um exemplo de ação para melhoria das condições de vida numa comunidade.

O plano trata-se de um projeto de desenvolvimento para toda a Vila Autódromo, que fica ao lado do antigo do Autódromo de Jacarepaguá, local onde está sendo construído o Parque Olímpico da Rio-2016. Desde antes do início das obras do principal local de competições, a prefeitura da cidade pensa em remover moradores do bairro para abrir espaço para projetos ditos essenciais para a realização do evento esportivo.

Foi justamente por causa da ameaça de remoção que a Vila Autódromo uniu-se em torno de um projeto viável para a permanência dos moradores em suas casas. Após um ano de discussões, incluindo também alguns especialistas da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e da UFF (Universidade Federal Fluminense), surgiu o Plano Popular.

"O plano é uma prova de que é possível ficarmos aqui, mesmo com a Olimpíada", afirmou o presidente da Associação dos Moradores da Vila Autódromo, Altair Guimarães, um dos líderes da mobilização que resultou no projeto de reurbanização do bairro. Ele tem 59 anos e trabalha como segurança e entregador de jornais. Vive na Vila Autódromo há 20 anos.

Guimarães participou das 20 assembleias que definiram quais eram as principais necessidades do bairro, nascido na década de 1970 e que, hoje, abriga cerca de 500 famílias.  O resultado dessas assembleias, apoiado em projetos técnicos de colaboradores das universidades, virou o Plano Popular. 

Desde projetos para construção de uma creche, ideias para combate a enchentes no bairro e até para geração de renda para os moradores, tudo foi proposto no plano. Nele, está descrito também o que é necessário fazer para que o Rio de Janeiro possa tocar as obras e receber a Olimpíada de 2016 sem que a Vila Autódromo seja extinta.

"A prefeitura disse que precisa que uma passarela termine bem em cima de onde estão algumas casas", afirmou Guimarães. "Nós, junto com os especialistas, propomos que essa passarela seja colocada um pouco para o lado para manter mais casas onde estão."

A SMH (Secretaria Municipal de Habitação) informou na terça-feira que a intenção da prefeitura é reassentar 278 famílias da Vila Autódromo para canalizar rios que passam pelo local e desaguam na Lagoa de Jacarepaguá, e ainda para duplicar avenidas que dão acesso à área do Parque Olímpico. Todas as famílias que precisariam sair teriam direito a um apartamento em um conjunto que está sendo construído a um quilômetro da comunidade, sem ter que pagar por ele.

De acordo com o Plano Popular da Vila Autódromo, entretanto, ninguém teria que deixar o bairro. Só 82 famílias sairiam de suas casas para abrir espaço para as intervenções necessárias. Todos eles, porém, receberiam uma nova moradia construída em áreas vazias existentes na própria vila, gastando inclusive muito menos do que a prefeitura orçou para remover parte do bairro.

Só pelo terreno em que estão sendo construídos os apartamentos para moradores da Vila Autódromo, a prefeitura do Rio de Janeiro pagou cerca de R$ 20 milhões. A área tem 80 mil m2 e fica na Estrada dos Bandeirantes. O UOL Esporte revelou que, segundo um estudo da própria prefeitura, o local tem risco de deslizamentos.

Já o Plano Popular da Vila Autódromo prevê um investimento de R$ 13,5 milhões. O valor seria aplicado justamente na construção das 82 casas necessárias para o reassentamento de famílias dentro bairro. Essas famílias vivem a menos de 15 metros da Lagoa de Jacarepaguá e ocupam uma área que precisa ser preservada por questões ambientais.

PREFEITURA QUER LEVAR DESABRIGADOS DA RIO-2016 PARA ÁREA DE RISCO

  • Vinicius Konchinski/UOL

    A Prefeitura do Rio de Janeiro decidiu levar para uma área de risco as cerca de 500 famílias que serão removidas da Vila Autódromo para a construção do Parque Olímpico dos Jogos de 2016. O terreno em que estão sendo erguidos os prédios, nos quais viverão parte dos desabrigados pelas obras para a Rio-2016, tem possibilidade de deslizamento.

Discussão com a prefeitura

A SMH informou que a prefeitura está em constante diálogo com moradores da Vila Autódromo em busca de soluções para a comunidade. Questionado sobre o Plano Popular, o órgão não disse se as sugestões do documento serão incorporadas pelo projeto da administração municipal para a área.

A discussão municipal para a remoção completa ou parcial da Vila Autódromo é antiga. Segundo associação de moradores do bairro, desde 1993, quando o prefeito Eduardo Paes ainda era subprefeito responsável pela área em que fica a Vila Autódromo, eles se sentem ameaçados.

Eles dizem que, na preparação para os Jogos Pan-Americanos de 2007, quando a área do Autódromo de Jacarepaguá recebeu as primeiras arenas esportivas, já se cogitava a remoção da Vila Autódromo. Com o início da preparação para os jogos, o assunto voltou à tona com uma determinação ainda mais forte da administração municipal para remoção dos moradores.

"Há muito interesse naquela área", afirmou a arquiteta Giselle Tanaka, uma das profissionais que ajudou na elaboração do Plano Popular. "Após a Olimpíada, o Parque Olímpico vai virar um bairro. Construtoras que trabalham nas obras não querem a Vila Autódromo ali."

Até um ano atrás, a intenção da prefeitura era remover todas as famílias da Vila Autódromo de suas casas. Após vários protestos da comunidade, porém, que esse número baixou para 278.

A SMH informa que vem negociando com cada família para conseguir tocar seu projeto de obras para a Vila Autódromo. O órgão informou que 248 famílias –30 a menos do que a meta– já optaram pela mudança para um apartamento no novo conjunto. Além delas, 146 se apresentaram para pedir sua mudança para um novo bairro, chamado de Parque Carioca.

A Associação de Moradores da Vila Autódromo não se pronuncia sobre esses números. Contudo, afirma que a maioria dos moradores quer ficar. "Nós temos um plano para comunidade e não queremos sair", finalizou Guimarães.

Remoções no Rio

A SMH informou que a remoção da Vila Autódromo é a única ligada à realização da Copa do Mundo de 2014 e à Olimpíada de 2016. De acordo com o órgão, nenhum outro reassentamento foi ou será causado pelos megaeventos esportivos.

Segundo o Dossiê Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Rio de Janeiro, contudo, o número de famílias do Rio já removidas ou ameaçadas por remoções supera 8 mil. O documento foi divulgado em maio deste ano. Segundo o dossiê, 500 famílias terão de deixar a Vila Autódromo por causa da Olimpíada.

RIO DE JANEIRO ESTÁ ATRASADO NA PREPARAÇÃO PARA A OLIMPÍADA

RIO-2016 JÁ CUSTÁ R$ 29,2 BI E SUPERA ESTIMATIVA DA CANDIDATURA

  • Faltam três anos para o início da Olimpíada de 2016, e o evento ainda não tem um orçamento oficial. O que já se sabe, contudo, é que os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro custarão mais do que o informado no dossiê de candidatura da capital fluminense à sede do megaevento.

  • Apesar de uma boa parte das obras necessárias para a Rio-2016 não ter um custo definido, os projetos relacionados ao evento que já têm, no mínimo, um orçamento inicial custarão R$ 29,2 bilhões. Em 2008, o comitê de candidatura do Rio à cidade-sede da Olimpíada estimou que R$ 28,8 bilhões fossem necessários para a preparação para os Jogos.

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