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Roberto Salim

Na família de Rebeca Andrade, a maior ginasta é dona Rosa, mãe de 8 filhos

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Roberto Salim

Roberto Salim, repórter da Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, Gazeta Esportiva, Última Hora, Revista Placar, ESPN Brasil. Cobriu as Olimpíadas de Barcelona, Atlanta, Sydney, Athenas, Pequim e Londres. Na ESPN Brasil realizou mais de 200 documentários no programa 'Histórias do Esporte', ganhando o Prêmio Embratel com a série 'Brasil Futebol Clube' e o Prêmio Vladimir Herzog.

Colunista do UOL

“Oi, bom dia, entre!”, disse sorridente dona Rosa, mãe de oito filhos que dormiam em um pequeno cômodo, no fundo de uma casa na Vila Fátima, um bairro humilde de Guarulhos. A frase, dita com sinceridade, era um convite inviável: quase não dava para entrar na residência alugada a muito custo pela empregada doméstica em 2014. Mas apesar das dificuldades, ela não perdia o sorriso, a esperança e a humildade: "entre que a gente se aperta um pouco."

Entramos e então ela falou sem parar do futuro reservado para sua filha Rebeca, que tinha 13 anos e se tornaria uma grande atleta. “Eu não falei?”, disse mais uma vez exibindo seu sorriso, a mãe da ginasta Rebeca Andrade, na noite desta quinta-feira, logo após sua filha se tornar a 11ª ginasta do planeta. Só ela sabe o que passou nestes anos para assegurar o estudo das crianças, a alimentação e o sonho de todos eles. Foi ela a verdadeira ginasta da família.

“Tenho uma filha que quer ser cantora, outros que querem se formar e três pequenos que já são ginastas, além da Rebeca é claro”.

Quando a menina começou a se destacar, a patroa de Rosa resolveu em um ato incomum de generosidade, permitir que a família se mudasse para um apartamento mais aconchegante no Parque Cecap.

“As coisas começaram a melhorar aí”.

Rebeca era aposta garantida. Seus saltos eram executados com uma potência incomum e sua técnica Kelly Kitaura falava na execução de um inédito triplo twist, que seria um furor aqui no Rio de Janeiro.

“Ela é um fenômeno”, dizia a técnica durante os treinamentos em Três Rios, região serrana do Rio, onde a seleção de ginástica se preparou durante um bom tempo.

Tudo conspirava a favor de uma consagração olímpica. Foi quando a menina teve um problema muito sério no joelho. Mas Rosa não perdeu a esperança, a alegria e a fé. Em uma manhã de junho de outubro do ano passado, Rebeca foi operada no Hospital Samaritano, em São Paulo. A cirurgia correu muito bem, mas as dores da madrugada seguinte, já no apartamento onde moravam, trouxe lágrimas ao rosto da menina. Não da mãe, que correu até a primeira farmácia que abriu para comprar o remédio receitado.

“Vai passar logo, filha, essa dor passa”.

Poucos acreditavam que daria tempo da filha de Rosa se recuperar para os Jogos Olímpicos. Mas se recuperou e foi muito bem na competição. Teria ido melhor ainda se o Comitê Olímpico Brasileiro tivesse usado de bom senso e colocado a técnica Kelly Kitaura ao lado da menina no tablado. Com sua treinadora ao lado, não teria feito uma exibição fraca na trave e poderia ter chegado entre as oito primeiras classificadas.

“A gente até questiona o motivo de não terem colocado a Kelly, mas ninguém explica”, disse Rosa, super-feliz com o desempenho geral da sua menina. “Ela não ganhou medalha, mas representou muito bem o nosso país. Para nós, o 11º lugar é ouro. E a Rebeca tem só 17 anos... que venha Tóquio em 2020”.

É preciso dizer que Rosa falou isso com um enorme sorriso no rosto?

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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