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Roberto Salim

"Verei desenho na TV, e não a abertura", diz desalojado da Vila Autódromo

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Roberto Salim

Roberto Salim, repórter da Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, Gazeta Esportiva, Última Hora, Revista Placar, ESPN Brasil. Cobriu as Olimpíadas de Barcelona, Atlanta, Sydney, Athenas, Pequim e Londres. Na ESPN Brasil realizou mais de 200 documentários no programa 'Histórias do Esporte', ganhando o Prêmio Embratel com a série 'Brasil Futebol Clube' e o Prêmio Vladimir Herzog.

Colunista do UOL

Milhões de pessoas estarão assistindo em todo o planeta a festa de abertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Mas numa Vila em Curicica a televisão estará ligada em qualquer outra atração que não lembre a milionária competição. Na rua Ísis, número 125, a família Trindade quer a maior distância possível do evento.

“Com certeza não verei a abertura, vou estar com a televisão ligada num desenho, ao lado de minha filha e da minha esposa Geane”, garante Marcelo da Silva Trindade, que trabalha como segurança eletrônico e que em março do ano passado se livrou da maior tragédia que pode se abater sobre um pai: a residência onde morava quase caiu e o reboque cobriu o quarto da pequena Beatriz.

“Tudo porque a Prefeitura queria nos expulsar da Vila Autódromo e a movimentação dos tratores rachou nossa casa”.

Diga-se de passagem que as casas da Vila Autódromo, ao lado do Parque Olímpico, não eram barracos. Era um concessão de 95 anos dada aos trabalhadores pelo governo do Rio de Janeiro. Eram construções de alvenaria. O sobrado da família de Marcelo era sólido, com varanda, quintal e o quarto de Beatriz, que quase ruiu.

“Foi horrível, caíram pedaços de cimento no quarto da Bia, perto da cama. A casa foi cedendo, ficando torta, não tinha mais como permanecer lá. E, então, acabei aceitando a indenização proposta pela Prefeitura e me mudei no dia 10 de setembro”.

A Prefeitura pagou 290 mil reais pela casa.

“Valia muito mais, mas como a gente ia continuar lá? Não dava e eu arrumei uma casa no mesmo preço e resolvi sair”.

A nova morada fica a meia hora da Vila Autódromo.

“A Prefeitura reformou algumas casas e alguns moradores seguem lá, acho que 20 famílias, mas pode ter certeza de que é um engana-trouxa, quando acabar a Olimpíada eles vão derrubar tudo. O projeto deles é transformar aquilo em condomínio, eu não tenho dúvida”.

Marcelo sente saudades dos amigos, da facilidade para ir ao trabalho e do quintal da casa da rua José Carlos Pacce, onde Bia brincava com as amiguinhas sem a menor preocupação. Ela fez 5 anos no último dia 21 de julho. “Nós fizemos uma festinha, mas na Vila Autódromo teria sido muito maior”.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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