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Por que mulheres gostam e praticam ‘menos’ esportes do que os homens?

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Garota Laura foi proibida de jogar futebol com os meninos de sua cidade (São Carlos), em um torneio regional imagem: Facebook/Reprodução

Colaboração para o UOL

Provavelmente, a maioria das mulheres que você conhece não é muito “chegada” a esportes, não acompanha futebol e não pratica com frequência nenhuma modalidade. Isso é a prova de que essa é uma área "para homens" mesmo, certo?

Errado. Afinal de contas, quantas dessas mulheres que não gostam ou não praticam esportes já tiveram oportunidades de serem apresentadas a eles? Quantas foram incentivadas a acompanhar, a jogar?

Há algumas semanas nos deparamos com o dilema que a garota Laura Pigatin, de 12 anos, enfrentou pela segunda vez seguida. Foi proibida de jogar futebol com os meninos de sua cidade (São Carlos), em um torneio regional, pelo simples fato de ser uma menina. Mas como essa garota vai fazer pra praticar o esporte que mais ama?

Ouvimos algumas justificativas sobre o assunto:

"Ah, ela que procure um campeonato feminino e outras garotas para jogarem futebol juntas". Sim, esse seria o mundo ideal, onde a prática do futebol (e de outros tantos esportes) fosse incentivada para as garotas desde sua infância, mas sabemos que isso não acontece. Não há escolinhas e nem inclusão para meninas praticarem esporte, seja na escola ou na rua, entre os colegas. Meninas, raramente ganham uma bola de presente, por exemplo. Elas ainda são educadas para cuidarem das bonecas, brincarem de casinha e se vestirem como princesa. Não há problema nenhum nisso, mas desde que ela possa optar em brincar com aquilo que mais gosta e seja apresentada para outras brincadeiras e atividades também.

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Por falta de meninas para jogar, Laura procurou um time "misto" e foi bem recebida pelos colegas imagem: Facebook/Reprodução

"Não é possível que Laura jogue no meio dos meninos. Ela pode se machucar e atrapalhar o desenvolvimento do jogo deles". A Laura joga bola desde os 4 anos e, por falta de meninas para montar um time, ela acaba jogando o famoso "misto", se misturando com os meninos, que para falar a verdade, nem se importam com o fato dela ser uma menina. Ela é habilidosa e capitã da equipe. Acham mesmo que ela atrapalha o jogo? E, aos 12 anos, existe alguma grande diferença significativa de estrutura física entre meninos e meninas?

"É muito chato jogar com meninas". Chato é privar uma criança de fazer aquilo que gosta e sabe. Chato é passar por essa situação por mais de uma vez e não ver nenhuma sensibilidade entre os organizadores do torneio. Qual é o problema que essa menina causa para estar em campo?

Recente pesquisa global encomendada pela marca Always (líder em produtos para cuidados femininos) demonstra com clareza as dificuldades que as mulheres precisam enfrentar para seguir no esporte.

Veja alguns empecilhos identificados:

- Até os 17 anos, o final da puberdade, mais da metade das meninas (53%) terá abandonado o esporte, justamente no momento em que o esporte poderia beneficiá-las mais;

-  71% das meninas afirma que não cresceu com modelos femininos no esporte e 80% gostaria que houvessem mais modelos de mulheres nos esportes;

- Os principais desafios para as meninas continuarem a praticar esportes são de que a maioria das pessoas acreditam que as meninas são piores em esportes do que os rapazes (36%), a falta de incentivo da participação esportiva por amigos / familiares (35%), e a falta de respeito para meninas em esportes (30%);

Menina Laura não é o único exemplo

Laura não é a primeira e nem será a última menina a ter que resistir dentro do esporte e provar que pode, sabe e tem o direito de praticá-lo. Ouvindo as histórias de atletas e pós-atletas (do futebol, vôlei, basquete, rúgbi, lutas e etc.) o discurso é majoritariamente sempre o mesmo, de enfrentamento. De precisar desbancar familiares, amigos da rua, irmãos e professores para fazerem aquilo que amam.

As mulheres sempre enfrentam mais barreiras do que os homens para praticar esportes. Para eles, o sentimento de desconfiança se dá por conta da carreira, da falta de estudo, das poucas oportunidades. Para elas, é tudo isso e muito mais: "o esporte não é feito para você", "isso não é coisa de menina", "você não sabe jogar".

Um desses exemplos de persistência e enfrentamento é a jogadora de futebol Formiga, que defende a seleção brasileira há mais de 20 anos. Quando garota, arrancava a cabeça de suas bonecas para poder jogar futebol. Na rua, batia bola com os meninos e apanhava dos irmãos quando chegava em casa. Eles diziam que aquilo não era para ela.

Kadri Mohamed/Xinhua
Jogadora da seleção brasileira, Formiga tirava cabeças de bonecas para poder jogar futebol imagem: Kadri Mohamed/Xinhua

Em um país onde as mulheres representam 51,3% da população brasileira e estão cada vez mais se profissionalizando e se emancipando, ainda precisamos olhar com mais atenção para as mais jovens e encorajá-las a serem aquilo que quiserem. Sem preconceitos, sem proibições e sem menosprezo.

Elas merecem o mesmo espaço que os homens - nada mais e nem menos do que eles têm. Essa luta por igualdade também atende pelo nome de feminismo e esse movimento é o grande impulsionador para provocar mudanças comportamentais em nossa sociedade.

*Roberta Nina Cardoso é jornalista e co-fundadora do portal Dibradoras (www.facebook.com/dibradoras), que busca dar visibilidade às mulheres no esporte.

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