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Jogos expandem os "sports bar" pela capital chinesa

Jogos expandem os "sports bar" pela capital chinesa

Vida boêmia no bairro de Sanlitun ainda se adapta a estrangeiros

14/08/2008 - 15h59

Chineses e gringos expatriados torcem separados em bares de Pequim

Rodrigo Bertolotto
Em Pequim (China)

Com pernas e ombros de fora, a cantora solta um pop chinês fazendo caras e bocas. Quando toca o último acorde no teclado, o público rompe em aplausos. Ela agradece com um "Xie Xie" (Obrigada). Mas logo percebe que a ovação é para o gol das chinesas que ganha replay na tela logo ao lado. As pessoas começam a repetir o mantra da torcida local: "Zhong Guo, Jia Yau" (literalmente, "China, Dá um Gás").

Durante as Olimpíadas, praticamente todos os locais de venda de bebida de Pequim ganharam o selo de "sports bar". As projeções de clipes românticos foram substituídas por transmissões de qualquer esporte, até para os poucos populares arqueiros e remadores. Saem as músicas de amores impossíveis, entram as cenas de todas as medalhas possíveis da China.

Depois é a vez de uma garota subir ao palco, enquanto os atletas sobem no pódio dentro da tela. Ela faz uma dança sexy simultânea ao hino nacional que o vencedor chinês escuta. O próximo número é um dança do ventre. E a graça da bailarina em trajes árabes contrasta com as trombadas das jogadoras de basquete em campo.

Mas o conceito do bar temático sobre esportes não entrou no receituário dessa China que se esforça para digerir o Ocidente. Apesar do sucesso de Yao Ming nos EUA, poucos chineses se aventuram, por exemplo, no "Goose and Duck", pub que vai além dos triviais dardo e bilhar e oferece até uma cesta de basquete em sua decoração.

O lugar é povoado por executivos expatriados dos EUA, seguidores dos campeonatos do outro lado do Pacífico com siglas como nome (NBA, NFL, MLB, NHL, etc). O cenário se repete no Frank´s Place, primeiro bar ocidentalizado de Pequim. Foi inaugurado em 1989, mesmo ano em que o governo comunista esmagou o movimento estudantil que pedia na Praça da Paz Celestial mais liberdade política no país.

A democracia não veio, mas veio muito investimento estrangeiro até a China assumir o posto de terceira economia mundial. Os pequineses, porém, ainda tentam se acostumar com tantos estrangeiros pelas ruas. Há ainda uma forte xenofobia, resultante do passado de invasões (de japoneses, ingleses, alemães, franceses e portugueses) e do isolamento após a Revolução Comunista de 1949. Como efeito colateral, chineses e estrangeiros residentes no país torcem em bares diferentes durante os Jogos Olímpicos.

Prova disso, na mesma hora em que a China parava para assistir a Yao Ming e Yi Jianlin no garrafão, os freqüentadores do pub Den preferiam ir direto ao gargalo da cerveja enquanto acompanhavam uma luta de um boxeador conterrâneo. Mas o "boxing kangaroo" acabou perdendo por 6 a 0 para o tunisiano, e os habitués do local focaram a empolgação no corpo mignon da garçonete em roupas típicas.

As paredes são todas decoradas com camisetas de clubes de rúgbi da Austrália, entre uma dúzia de telas planas mostrando as Olimpíadas ao vivo, parecendo uma sala de controle de circuito interno de TV. A freqüência é um verdadeiro commomwealth, com representante de toda a comunidade britânica, com canadenses, neozelandeses, sul-africanos e que tais.

"Ei, irlandeses, venham conhecer umas amigas minhas", grita o australiano Mark Sobel, em uma mesa com três garotas. "Podem ficar com elas, porque eu prefiro as irlandesas. Elas têm olhos azuis e sabem beijar", teoriza, com uma caneca de cerveja belga na mão.

Na tela, levantamento de peso. No balcão, levantamento de copo. O bairro é Sanlitun, área que concentra a vida boêmia, as lojas de grifes européias e os melhores bares e casas noturnas. Tudo porque foi ali que o governo comunista colocou as embaixadas na década de 1950, transformando na região mais cosmopolita da capital chinesa.

A globalização também trouxe as franquias para lá. Na frente, do pub Den está a filial pequinesa da lanchonete Hooters, originária dos EUA. Sua marca registrada são as garçonetes com trajes sumários para atrair o público masculino. O decote e o short, porém, não combinam com o corpo esguio das chinesas, sem as curvas necessárias para rechear o modelito. Mas o vai e vem das garotas rouba um pouco a atenção dos eventos olímpicos passando na tela.

A mania de importar franquias é tão forte que os chineses já têm até suas versões, como o Jackie Chan Café. Basta saber quando a cafeteria do astro dos filmes de porrada vai começar a ser exportada.

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